Para Dieese, crise não atrapalha e bancos podem conceder aumento real

As expectativas para a Campanha Nacional dos Bancários deste ano são boas e as negociações com os bancos, iniciadas na terça-feira 18, devem render bons frutos, como o aumento real de salários. A avaliação é do diretor técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, que afirmou também que o Brasil foi um dos países que melhor reagiu à grave crise econômica internacional e grande parte desta resistência se deve aos trabalhadores.

Clemente falou durante a 3ª Jornada Nacional de Debates, realizada no mesmo dia, no Sindicato dos Eletricitários de São Paulo. Segundo ele, o governo federal tomou uma série de ações anticrise que foram propostas pelo movimento sindical. “A política econômica anticíclica do governo foi proposta pelos sindicatos. Entre as ações estão a ampliação dos investimentos públicos, do PAC e das empresas estatais, o fortalecimento dos programas sociais, a redução do superávit primário, a valorização do salário mínimo. Daqui para frente, onde houver investimento público terá contrapartida social, exigida pelos sindicatos durante a crise. A ampliação da parcela do seguro desemprego, a desoneração tributária e a reafirmação da agenda do trabalho decente, tudo isso é proposta dos sindicatos”, disse o economista.

Para Clemente, o Brasil está se “segurando bem” nesta crise e perto do resto do mundo o país está numa situação ótima. “O mundo ainda está demitindo e nós aqui já estamos retomando a geração de empregos. Inclusive, um dos grandes trunfos do Brasil nesta crise foi o crescimento da massa salarial do trabalhador nos últimos anos, que segurou a economia neste momento”, comenta.

Para Roberto von der Osten, secretário de Finanças da Contraf-CUT, a rápida recuperação da economia brasileira e a rentabilidade dos bancos são fatores para que as reivindicações dos bancários sejam atendidas na campanha salarial deste ano. “O setor financeiro foi pouco atingido mesmo no pior da crise. Não há motivo para fugir das demandas dos trabalhadores”, afirma. “O atual patamar de lucros das empresas financeiras é um verdadeiro abuso com os trabalhadores e a sociedade brasileira. Os bancos precisam colocar na prática o discurso de responsabilidade social, começando dentro de casa e valorizando seus funcionários”, defende.

Resultados positivos

Corroboram essa análise os resultados das negociações salariais das categorias com data-base no primeiro semestre, que registraram resultados melhores que os apurados em 2008. “Mesmo com a crise, a performance sindical melhorou nos primeiros seis meses do ano. Isso deve se repetir no segundo semestre, principalmente com as negociações que envolvem categorias mais fortes, com presença nacional, como os bancários, metalúrgicos e petroleiros”, analisou Clemente.

Durante o evento, Clemente apresentou os resultados do levantamento feito pelo Dieese com 245 categorias que tem data base no primeiro semestre. Entre elas, o percentual de negociações com reajustes iguais ou acima da inflação ficou próximo a 93%, enquanto em 2008 as categorias que conseguiram este desempenho positivo giravam em torno dos 87%.

Este quadro confirma que, de maneira geral, a crise mundial teve pouco efeito sobre os resultados dos reajustes nas negociações coletivas. “Em geral, as empresas que fizeram ajustes durante a crise focaram no desemprego e na rotatividade, e não no aumento de salários. Aliás, os empresários têm compensado os reajustes com a rotatividade, que é muito alta no Brasil”, explica Clemente.

Das 245 categorias analisadas, 76,7% tiveram reajustes acima da inflação no primeiro semestre, contra 72,2% em 2008. Conseguiram apenas repor os salários 15,9%, contra 14,7% no ano passado. Apenas 7,3% tiveram reajuste abaixo da inflação; em 2008 foram 13,1%.

Dos três setores de atividade analisados, a indústria foi o que mais sofreu com a redução da atividade econômica causada pela crise internacional, e o percentual de reajustes salariais inferiores à inflação cresceu de 6% em 2008 para 9% em 2009. No comércio, somente um dos 31 acordos assinados por entidades sindicais do setor apresentou reajuste insuficiente para a reposição das perdas salariais em 2009, contra quatro em 2008. O setor de serviços apresenta a maior mudança no quadro dos reajustes salariais. Neste ano, cerca de 72% das negociações analisadas do setor obtiveram reajustes com incorporação de aumentos reais, o que implica um crescimento da ordem de 12 pontos percentuais em relação a 2008 – o maior na comparação entre os setores.

Desafios

Apesar da situação positiva do trabalhador brasileiro, Clemente destaca que os desafios do movimento sindical ainda são grandes. Para o economista do Dieese, entre as prioridades agora estão garantir a redução da jornada de trabalho, a manutenção da política de valorização do salário mínimo, a regulamentação das terceirizações, a ratificação das convenções 151 e 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o fim do fator previdenciário e das práticas anti-sindicais e a elevação dos pisos salariais. “A agenda está em aberto. Precisamos olhar as oportunidades e colocar nossa pauta na ordem do dia”, ressalta.

Enquanto os trabalhadores contribuíram para blindar o Brasil contra a crise, os bancos que atuam no país jogaram contra. Por isso, Clemente Ganz Lúcio defende com veemência a regulamentação do sistema financeiro. “Um dos problemas mais graves do Brasil são os spreads. As taxas dos bancos ainda são altas e temos um espaço muito grande para pressionar as instituições financeiras. O Banco do Brasil e a Caixa Federal acabam de provar que é possível baixar os juros, também reduzidos graças à pressão do movimento sindical”, explica Clemente.

O presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Luiz Cláudio Marcolino, destaca que a CUT luta há décadas pela regulamentação do sistema financeiro nacional. “A Constituição de 1988 deveria ter feito isso, mas deixou em aberto o artigo 192 que trata da questão. Desde então, os sindicatos dos bancários estão pressionando o Congresso Nacional e o governo para colocar rédeas nos bancos”, destaca.

Entre as propostas defendidas pelo Sindicato para diminuir os abusos dos bancos e favorecer a sociedade estão a redução dos juros em todas as modalidades de empréstimos, a redução da alta lucratividade do sistema bancário e dos rentistas e a menor transferência de renda de pessoas e empresas para os que se apropriam dos ganhos financeiros. “Precisamos definir um novo papel para o sistema bancário do Brasil, para que ele seja voltado ao financiamento da produção e do desenvolvimento”, finaliza Marcolino.

Fonte: Contraf-CUT, com Fábio Jammal Makhoul – Seeb SP

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