País com bancos públicos tem vantagem estrutural, diz presidente do BNDES

Uma homenagem à economista Maria da Conceição Tavares no Rio de Janeiro se transformou na segunda-feira, dia 13, num ato em defesa do papel do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social) no financiamento de investimentos de longo prazo, sobretudo em períodos de crise.

“A economia que dispõe de capacidade pública de operar sistemas bancários e de crédito é uma economia que tem uma superioridade estrutural, porque consegue exercer uma ação anticíclica dentro do sistema, e não apenas por fora, através do gasto [orçamentário], que não é maneira eficiente em tempo algum de financiar investimentos de longa maturação”, disse Luciano Coutinho, presidente do BNDES.

Ele citou os exemplos dos Estados Unidos e do Reino Unido, onde a crise financeira paralisou o crédito privado, e os governos hoje cogitam criar bancos ou fundos públicos de investimento. “Bancos de investimento parecem cada vez mais fundamentais”, afirmou.

A homenagem a Conceição Tavares, que completou 80 anos neste ano, ocorreu na sede do banco estatal, onde foi lançado o livro “O Papel do BNDES na Industrialização do Brasil”, fruto de pesquisa coordenada por ela para o Centro Internacional Celso Furtado.

“É uma casa de muita resistência, valentia, e, mesmo quando é pensamento de alguns dirigentes acabar com ela, não conseguem”, disse a economista, que nos anos 50 trabalhou no Grupo BNDE-Cepal (Comissão Econômica para a América Latina) _o banco, criado em 1952, só ganhou o S de social em 1982.

A plateia incluía ex-diretores do BNDES e dois dirigentes do Ministério Fazenda que foram alunos de Conceição Tavares: Nelson Barbosa, secretário de Política Econômica, e Luiz Eduardo Melin, chefe de gabinete.

O BNDES tem sido criticado por setores liberais tanto pelo aporte que recebeu do Tesouro desde a crise de 2008, de R$ 180 bilhões, quanto por emprestar a empresas já consolidadas. Alguns economistas também alegam que os juros subsidiados do banco retardam a queda da taxa básica do Banco Central.

Apesar da defesa do crédito estatal, tanto Barbosa quanto Coutinho enfatizaram o “empenho” do governo para desenvolver um sistema privado de financiamento de longo prazo. É uma tarefa que ficou pendente na modernização do país, segundo o presidente do BNDES.

“Durante todo o período da industrialização, o recurso ao endividamento externo era a contrapartida dessa fragilidade intrínseca de não se dispor de um sistema capaz de transformar poupança em financiamento de longo prazo”, afirmou.

Todos lembraram, porém, que o sistema de crédito privado é pró-cíclico, isto é, só funciona quando a economia está crescendo. “Isso não é opinião, é fato. Basta analisar a história. Por isso precisa de uma ação do Estado para estabilização e eventualmente suprir lacunas”, disse Barbosa.

Entre as lacunas, ele citou áreas com “grande retorno social, mas com retorno privado não tão elevado, ou [áreas] onde tem uma incerteza ou o tamanho do projeto é muito grande e requer ação do governo”. “Isso é basicamente infraestrutura”, completou.

O secretário se disse otimista em relação ao aumento do crédito privado no Brasil. “O mercado de longo prazo tem a ver com taxa de juros, com liquidez (capacidade de vender quando precisar) e com medidas regulatórias. Então acho que haverá essa expansão.”

Conceição Tavares se mostrou mais cética. “Se estabilizar um desenvolvimento econômico sustentado, é possível que a reboque se possa fazer um mercado de capitais mais interessante.”

Ao desejo de Coutinho de que ela continue “pensando e falando” daqui a dez anos, a economista disse que isso só não ocorrerá se houver outra crise econômica no país. “Se o Brasil capotar, eu capoto junto.”

A economista pernambucana Tânia Bacelar, que faz parte da diretoria do Centro Celso Furtado, contou que estava com Conceição Tavares em 2004 quando um motorista de táxi a reconheceu e cobrou-a por andar calada. “A senhora precisa falar porque os homens têm medo da senhora”, disse o taxista.

Na época, a economista veterana, que já foi deputada federal pelo PT, discordava da política econômica e monetária adotada pelo presidente Lula no primeiro mandato, mas evitava criticá-lo em público. Em entrevista à Folha, publicada no último domingo, Conceição Tavares disse que “brigou para burro” naquela época.

“Graças a Deus caiu o ministro (Antônio Palocci) e entrou o [Guido] Mantega, que é desenvolvimentista”, disse. Palocci faz parte da coordenação da campanha de Dilma Rousseff, mas a economista aposta que a petista, caso eleita, vai mudar a orientação conservadora do Banco Central.

Compartilhe:

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp
Compartilhar no telegram
Telegram