Em audiência com o governo, CUT e centrais exigem o fim do superávit primário

Ao falar em nome de todas as centrais brasileiras, na abertura de audiência realizada ontem no Palácio do Planalto, o presidente da CUT Artur Henrique disse que o governo federal precisa acabar com o superávit primário. “Não é possível que num momento de crise como esse, uma montanha de dinheiro seja usada para pagamento de dívidas, em vez de ser aplicada em investimentos produtivos que gerem desenvolvimento, emprego e renda”, disse Artur.

“O Brasil precisa manter e ampliar o fluxo de investimentos em programas como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), PDP (Programa de Desenvolvimento Podutivo) e nos Territórios da Cidadania, para citar alguns dos mais importantes”, afirmou. “E, por isso, precisa acabar, extinguiu, zerar o superávit primário”.

Artur guiou seu discurso pelo conceito do papel do Estado como indutor do desenvolvimento, e como tal responsável pela garantia dos investimentos em programas e políticas sociais como salário mínimo, Bolsa-Família e Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar).

O presidente da CUT também insistiu que os trabalhadores e trabalhadoras não só produzem as riquezas, mas também as consomem. “Para consumir, é preciso confiança. Se a ameaça de demissão paira sobre as cabeças dos trabalhadores, ele pára de consumir, de fazer crediário para adquirir uma geladeira, um fogão. Por isso, é preciso que o governo elimine a ameaça de demissão, estabelecendo de forma clara, e rápida, uma série de mecanismos que acenem para a proteção dos empregos atuais e para a preservação do ritmo de geração de novos empregos”.

Nessa linha, cobrou mais uma vez a criação de metas de contrapartidas sociais, como geração de empregos e qualificação dos trabalhadores, nos investimentos públicos, sejam empréstimos ou isenções fiscais. Afirmou ainda que esse conceito precisa ser explicitado, numérica e formalmente.

Outra forma de garantir um ambiente de confiança no trabalhador e, mais que isso, de garantias reais de que a crise financeira será enfrentada com prioridade para a proteção dos empregos e salários, Artur cobrou a ratificação da Convenção 158 da OIT – que ataca a alta rotatividade da mão-de-obra no País – a redução da jornada de trabalho sem redução de salários, o fortalecimento da agricultura familiar e o estabelecimento do limite de propriedade da terra. O presidente da CUT também pediu empenho do governo para a retirada de todos os projetos em tramitação no Congresso que têm por objetivo flexibilizar direitos trabalhistas. Para a construção de um futuro de maior soberania, lembrou também a necessidade de suspensão de todos os leilões de petróleo e de quaisquer processos de privatização.

Representaram a CUT na audiência também o secretário-geral, Quintino Severo e o diretor executivo Dary Beck Filho. Participaram da audiência aproximadamente mil pessoas de vários movimentos sociais. Pelo governo estiveram a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, o chefe da Secretaria Especial da Presidência, Luiz Dulci, o ministro da Previdência, José Pimentel, do Trabalho, Carlos Lupi e o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado. O presidente Lula, cuja presença era prevista, compareceu somente ao jantar que foi oferecido mais tarde às centrais sindicais. No momento da audiência,o presidente da República sobrevoava Santa Catarina, vítima das enchentes.

Jantar – À noite, Artur abriu o jantar oferecido pela Presidência da República com um discurso em que reforçou propostas apresentadas durante a audiência e em que também cobrou o fim do fator previdenciário e a urgente mudança das alíquotas da tabela do Imposto de Renda, como forma de aliviar a carga tributária sobre os assalariados. Artur também entregou ao presidente Lula o documento unificado das centrais, com propostas de enfrentamento da crise, desenvolvimento e distribuição de renda.

Durante o jantar, o presidente da CUT também cobrou do ministro do Trabalho, Carlos Lupi, a revogação da Instrução Normativa 1, que pretende criar o imposto sindical para servidores públicos, cobrou também o envio do projeto que acaba com o imposto sindical e cria a contribuição negocial democrática, e criticou o projeto de regulamentação da terceirização que o Ministério defende atualmente e que não leva em consideração propostas da CUT que defendem os direitos trabalhistas.

Para o presidente Lula, Artur também entregou a resolução da Executiva Nacional da CUT sobre a crise financeira internacional.

Veja a carta entregue pelos movimentos sociais ao presidente Lula

Cumprimentamos o governo federal pela iniciativa de ouvir os movimentos sociais e sindicais, populares, pastorais sociais e entidades que atuamos organizando nosso povo, diante do grave quadro de crise que já se faz sentir, e que – tudo leva a crer – se aprofundará sobre nossa economia, nossa sociedade e em especial sobre o povo brasileiro.

Queremos aproveitar essa oportunidade para manifestar nossas propostas concretas que o governo federal deve tomar para preservar, sobretudo, os interesses do povo, e não apenas das empresas e do lucro do capital.

O conjunto dessas propostas se insere no espírito geral, de que devemos aproveitar a brecha da crise para mudar a política macroeconômica de natureza neoliberal, e ir construindo um novo modelo de desenvolvimento nacional, baseado em outros parâmetros, sobretudo na distribuição de renda, na geração de emprego e no fortalecimento do mercado interno.

Nossa preocupação fundamental é aproveitar para que nessa mudança se logrem medidas concretas que visem melhorar as condições de vida de nosso povo, garantindo os direitos à educação pública, gratuita, democrática e de qualidade em todos níveis, à moradia digna, ao acesso à cultura e às reformas urbana e agrária.

Infelizmente, a maioria do nosso povo não tem acesso a esses direitos básicos. Sabemos que poderosos interesses dos capitalistas locais, das empresas transnacionais e, sobretudo do sistema financeiro, concentra cada vez mais riqueza, renda, e impedem que nosso povo usufrua da riqueza por ele produzida.

Já estamos cansados de tanta dominação capitalista, e agora assistimos às crises financeiras e à ofensiva dos interesses do império que controla as riquezas naturais, minerais, a água, as sementes, o petróleo, a energia e o resultado de nosso trabalho.

Diante disso, queremos apresentar-lhe algumas propostas concretas para que possamos resolver, de fato, os problemas do povo, e impedir que de novo as grandes empresas transnacionais e os bancos transfiram para o povo o custo da crise:

Propostas de articulações internacionais:

1 – Defendemos como resposta à crise o fortalecimento da estratégia de integração regional, que se materializa a partir dos mecanismos como: Mercosul, Unasul e Alba.

2 – Apoiamos medidas como a substituição do dólar nas transações comerciais por moedas locais, como recentemente fizeram Brasil e Argentina, e sugerimos que esta medida deva ser adotada pelo conjunto dos paises da América Latina.

3 – Defendemos a consolidação o mais rápido possível do Banco do Sul, como um agente que promova o desenvolvimento regional e que auxilie o crescimento do mercado interno entre os paises da América Latina e como um mecanismo de controle de nossas reservas, para impedir a especulação dos bancos, do FMI, e dos interesses do capital dos Estados Unidos.

4 – Nós afirmamos que a atual crise econômica e financeira é de responsabilidade dos países centrais e dos organismos dirigidos por eles, como a OMC, o Banco Mundial e o FMI. Defendemos uma nova ordem internacional, que respeite a soberania dos povos e nações.

5 – Pedimos vosso empenho e compromisso pela retirada imediata de todas as forças estrangeiras do Haiti. Nenhum país da América Latina deve ter bases e presença militar estrangeira. Propomos, em seu lugar, a constituição de um fundo internacional solidário para reconstrução econômica e social daquele país. Apresentamos também nossa oposição à reativação da Quarta Frota da Marinha de Guerra dos Estados Unidos em águas da América Latina.

Propostas de politicas internas

1 – Controlar e reduzir imediatamente as taxas de juros.

2 – Impor um rigoroso controle da movimentação do capital financeiro especulativo, instituindo quarentenas e impedindo o livre circular, penalizando com elevados impostos suas ganâncias.

3 – Defendemos que todos os governos devem utilizar as riquezas naturais, da energia, do petróleo, dos minérios, para criar fundos solidários para investir na solução definitiva dos problemas do povo, como direito ao emprego, educação, terra e moradia. Para isso, o governo brasileiro precisa cancelar imediatamente o novo leilão do petróleo, marcado para dia 18 de dezembro.

4 – O governo federal deve revisar a política de manutenção do superávit primário, que é uma velha e desgastada orientação do FMI – um dos responsáveis pela crise econômica internacional. E devemos usar os recursos do superávit primário para fazer volumosos investimentos governamentais, na construção de transporte publico e de moradias populares para a baixa renda, dando assim uma grande valorização à reforma urbana e agrária, incentivando a produção de alimentos pela agricultura familiar e camponesa. É preciso investimentos maciços, na construção de escolas, contratação de professores para universalizar o acesso à educação de nossos jovens, em todos os níveis, em escolas públicas, gratuitas e de qualidade.

5 – Defendemos que o governo estabeleça metas para a abertura de novos postos de empregos, a partir de um amplo programa de incentivo à geração de empregos formais, em especial entre os jovens. Reajustar imediatamente o salário mínimo e os benefícios da previdência social, como principal forma de distribuição de renda entre os mais pobres.

6 – Controlar os preços dos produtos agrícolas pagos aos pequenos agricultores, implantando um massivo programa de garantia de compra de alimentos, através da Conab. Hoje, as empresas transnacionais que controlam o comércio agrícola estão penalizando os agricultores, reduzindo em 30%, em média os preços pagos do leite, do milho, dos suínos e das aves. Mas, no supermercado, o preço continua subindo.

7 – Revogar a Lei Kandir e voltar a ter imposto sobre as exportações de matérias primas agrícolas e minerais, para que a população não seja mais penalizada, para estimular sua exportação.

8 – O governo federal não pode usar dinheiro público para subsidiar e ajudar a salvar os bancos e empresas especuladoras, que sempre ganharam muito dinheiro e agora, na crise querem transferir seu ônus para toda sociedade. Quem sempre defendeu o mercado como seu “deus-regulador”, agora que assuma as conseqüências dele. Nesse sentido os bancos públicos (BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil) deveriam estar orientados não para socorrer o grande capital e sim para o benefício de todos os povos.

9 – Reduzir a jornada de trabalho, em todo o país e em todos os setores, sem redução de salário, como uma das formas de aumentar as vagas. E penalizar duramente as empresas que estão demitindo.

10 – A mídia permanece concentrada nas mãos de poucos grupos econômicos. Este quadro reforça a difusão de um pensamento único que privilegia o lucro em detrimento das pessoas e exclui a visão dos segmentos sociais e de suas organizações do debate publico. Para reverter esta situação e colocar a mídia a serviço da sociedade, é preciso ampliar o controle da população sobre as concessões de rádio e TV, fortalecer a comunicação pública e garantir condições para o funcionamento das rádios comunitárias, acabando com a repressão sobre elas. Por tudo isso, é urgente que o governo federal convoque a Conferencia Nacional de Comunicação.

11 – Para garantir os territórios e a integridade física e cultural dos povos indígenas e quilombolas como determina a Constituição, o governo federal deve continuar demarcando as terras e efetivando a desintrusão desses territórios em todo o país, sem ceder às crescentes pressões dos setores antiindígenas – tanto políticos, como econômicos. Na luta por seus direitos territoriais, os povos indígenas e quilombolas têm enfrentado a violência e a discriminação cada vez mais forte em todo o país. Chamamos especial atenção, nesse momento, para a urgência de se demarcar as terras tradicionais do povo indígena Guarani Kaiowá que vive no Mato Grosso do Sul. Atualmente, eles estão confinados em ínfímas porções de terra e, principalmente por causa disso, há um alto índice de suicídios entre o povo.

12 – Realizar a auditoria integral da dívida pública para lançar as bases técnicas e jurídicas para a renegociação soberana do seu montante e do seu pagamento, considerando as dívidas histórica, social e ambiental das quais o povo trabalhador é credor.

13 – Defendemos uma reforma política que amplie os espaços de participação do povo nas decisões políticas. Uma reforma não apenas eleitoral, mas que amplie os instrumentos de democracia direta e participativa.

14 – Em tempos de crise, há uma investida predatória sobre os recursos naturais como forma de acumulação fácil e rápida, por isso não podemos aceitar as propostas irresponsáveis de mudanças na legislação ambiental por parte dos representantes do agronegócio, que pretende reduzir as áreas de reservas legais na Amazônia e as áreas de encosta, topo de morros e várzeas no que resta da Mata Atlântica. Propomos a criação de uma política de preservação e recuperação dos biomas brasileiros.

15 – Contra a criminalizacao da pobreza e dos movimentos sociais. Pelo fim da violência e pelo livre direito de manifestação dos que lutam em defesa dos direitos econômicos, sociais e culturais dos povos.

Esperamos que o governo ajude a desencadear um amplo processo de debate na sociedade, em todos os segmentos sociais, para que o povo brasileiro perceba a gravidade da crise, se mobilize e lute por mudanças.

Atenciosamente,

Via Campesina
Assembléia Popular – AP
Coordenação dos Movimentos Sociais – CMS
Grito dos Excluídos Continental
Grito dos Excluídos Brasil
Associação Nacional de Ong’s – Abong
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
Central Única dos Trabalhadores – CUT
União Nacional dos Estudantes – UNE
Marcha Mundial de Mulheres – MMM
Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB
Central Geral dos Trabalhadores do Brasil – CGTB
Central de Movimentos Populares – CMP
Associação Brasileira de Imprensa – ABI
Confederação das Associações das Associações de Moradores – Conam
Caritas Brasileira
CNBB/Pastorais Sociais
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Movimento das Mulheres Camponesas – MMC
União Brasileira de Mulheres – UBM
Coordenação Nacional de Entidades Negras – Conen
Movimento dos Trabalhadores Desempregados – MTD
Movimento Trabalhadores Sem Teto – MTST
União Nacional Moradia Popular – UNMP
Confederação Nacional das Associações de Moradores – Conam
Movimento Nacional de Luta por Moradia – MNLM
Ação Cidadania
Conselho Brasileiro de Solidariedade com Povos que Lutam pela Paz – Cebrapaz
Associação Brasileira de Rádios Comunitárias – Abraço
Coletivo Brasil de Comunicação – Intervozes
Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais
Jubileu Sul Brasil
Movimento pela Libertação dos Sem Terras – MLST
União Estudantes Secundaristas – Ubes
União Juventude Socialista – UJS
Evangélicos pela Justiça – EPJ
União nacional de Entidades Negras – Unegro
Federação Estudantes de Agronomia do Brasil – Feab
Pastoral da Juventude do Meio Rural – PJR
Associação dos Estudantes de Engenharia Florestal – Abeef
Movimento dos Trabalhadores Desempregados – MTD
Confederação Nacional Trabalhadores Entidades de Ensino – Contee
Confederação Nacional Trabalhadores da Educação – CNTE
Confederação Nacional do Ramo Químico – CNQ/CUT
Federação Única dos Petroleiros – FUP
Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas – SintaP/CUT
Associação Nacional de Pós-graduandos – ANPG
Confederação Nacional dos Metalúrgicos – CNM/CUT
Movimento Camponês Popular – MCP
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – Couab
Conselho Indigenista de Roraima – CIR
Federação Trabalhadores Metalúrgicos do Rio Grande do Sul
Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade
Instituto Nacional Estudos Sócio-econômicos – Inesc

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