“Valeu a pena”, diz ativista do Greenpeace Ana Paula ao voltar ao Brasil

No saguão do Aeroporto de Porto Alegre, Ana Paula foi recebida pela família

A bióloga gaúcha Ana Paula Maciel desembarcou às 11h de sábado (28) no aeroporto Salgado Filho em Porto Alegre, onde era aguardada pelos seus familiares. A ativista do Greenpeace, de 31 anos, ficou dois meses presa e 40 dias sob custódia do governo russo, após participar de um protesto contra a exploração de petróleo no Ártico.

Ao chegar na Capital, com um ursinho polar na mochila e um cartaz dizendo “Salve o Ártico”, Ana Paula concedeu entrevista coletiva à imprensa e disse que os meses em que ficou presa na Rússia foram os mais difíceis de sua vida, mas que a ação “valeu a pena”.

“Foram os dois meses mais difíceis da minha vida. Mesmo esse último mês em que fiquei solta sob fiança, a tensão em volta era muito grande. Nos observavam o tempo inteiro”, relata. A bióloga foi presa com outros 29 tripulantes do navio Arctic Sunrise, durante manifestação em setembro.

O grupo ficou detido inicialmente na cidade de Murmansk sob a acusação de pirataria marítima. Posteriormente, foram transferidos para São Petersburgo, onde acabaram soltos sob fiança no final de novembro. Na semana passada, eles receberam anistia da acusação de vandalismo.

“Os dois meses na prisão valeram a pena porque foi uma tentativa frustrada da Rússia de calar o Greenpeace, uma organização pacífica e reconhecida mundialmente. Tiveram que admitir que não éramos piratas e não conseguiram provar quando nos acusaram de vandalismo”, declarou Ana Paula. Para ela, a anistia foi a forma que o país encontrou de sair do “buraco que cavou”.

“A reação da Rússia foi exagerada. A única maneira de saírem desse buraco foi concedendo a anistia. É difícil dizer que a Rússia é uma democracia. O sistema judiciário russo não é independente. Muitas vezes as decisões eram tomadas por um telefonema de alguém que ninguém sabia quem era”, criticou.

Ana Paula também condenou o sistema carcerário do país que, segundo ela, funciona para “humilhar e destruir psicologicamente”. A bióloga conta que passou por diversas humilhações. “Nós éramos transportados sempre algemados em caixinhas de metal dentro de caminhões e quando chegávamos na corte éramos colocados para esperar em uma solitária de 1m20 cm por 0,90m junto de quatro ou cinco pessoas”, descreve.

Ela lembra também que não havia paz na prisão. De acordo com a ativista, os prisioneiros eram acordados às 6h com uma música alta que era tocada até o horário de dormirem, às 22h. “Não tínhamos paz em nenhum momento da prisão. A noite nós íamos dormir e todos os outros presos acordavam para se comunicar entre eles através de um sistema. E durante o dia era impossível dormir por causa do rádio. Fiquei muito desesperada um dia que começou a chover e eu queria escutar o barulho da chuva”, recorda.

Ana Paula também quis esclarecer que a ação do Greenpeace não foi contra a Rússia nem contra a empresa Gazprom, proprietária da plataforma petroleira onde ocorreu o protesto. “Estamos contra o sistema das empresas de petróleo, o lobby petrolífero e o uso do óleo, porque é isso que está causando o aquecimento global”, afirma. Ela explica que o Ártico é como um refrigerador do planeta e se ele derreter completamente a Amazônia vira um deserto e todos os regimes de corrente marítima irão se alterar.

A bióloga diz ainda não temer em passar novamente pelo mesmo incidente e afirma que seguirá trabalhando. “Meu objetivo é mudar o mundo para melhor. Para mim, para os que estão por vir e para os que ficam. É preciso assumir os riscos. Vou seguir trabalhando e navegando”, declara ela, informando que irá descansar com a família durante um período para depois escolher seu próximo destino.

No final da coletiva, ela também ressaltou a influência do governo brasileiro e da imprensa no caso. “Se não fossem vocês e o governo a nos apoiarem eu ainda estaria atrás das grades. A bola fora que a Rússia deu com suas decisões arbitrárias foi que ela não esperava a repercussão mundial que tivemos”, concluiu.

O aguardo da família

Antes da chegada de Ana Paula a Porto Alegre, os seus familiares a aguardavam com uma mistura de ansiedade e tranquilidade, por saber que o pior já tinha passado. A ativista havia desembarcado em São Paulo por volta das 7h, após uma viagem que levou 12 horas.

Rosângela Maciel, mãe de Ana, ao ser questionada como estava o coração momentos antes de rever a filha respondeu: “Está batendo calminho. Porque foi tão turbulento em noventa dias que hoje ele está aliviado, calmo e sereno. Só com a emoção de uma mãe esperando por sua filha”, disse. Ela garante que seguirá a apoiando em novas viagens e acredita que o trabalho da filha será intensificado.

“Acredito que agora ela vai se engajar muito mais. Vai tirar proveito dessa descoberta, pois muita gente não sabia nem que o Ártico existia. A luta vai ser melhor, porque vai ter muito mais gente apoiando”, diz.

O pai de Ana, Jaires Maciel, o aguardava com uma orca de pelúcia para dar de presente e não escondia o orgulho da filha. “Tenho mais que orgulho. Tenho respeito pela causa que ela defende. Desde pequena ela pensa nos animais. Sempre foi inquieta”, diz.

A irmã Telma Maciel também destacou a personalidade de Ana. “Ela sai e a gente fica com o coração apertado. Desde pequena foi assim. Ela vai e faz. Se tiver que correr riscos, por ela tudo bem. Essa é a vida dela. Não poderia ser diferente”, diz Telma, que junto da avó e de outros familiares aguardavam Ana Paula com um cartaz dizendo: “A nossa Porto está mais Alegre com o teu retorno. Te amamos”.

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