Sete anos de luto pelo Banestado

(Curitiba) Beto Von der Osten, Marisa Stédile, Edílson José Gabriel e Geraldo Fausto dos Santos (Ceará). O que têm em comum esses nomes? Todos são trabalhadores bancários, dirigentes sindicais em suas respectivas bases e vieram do antigo Banestado. Incorporados ao banco Itaú desde 2000, Beto, Marisa, Edílson e Ceará comentam sobre o grande engodo do governo Jaime Lerner: a privatização do Banestado, um dos maiores patrimônios que o Estado do Paraná já teve e, atualmente, apenas uma triste lembrança na história de pelo menos 8.500 trabalhadores bancários, que sumariamente perderam seus empregos durante o processo de privatização do banco.

Para Beto Von der Osten, diretor da FETEC-CUT-PR, a afirmação, comum à época da privatização, de que “o Estado não tem que se meter no sistema financeiro”, se mostrou errônea ao longo dos anos, pois a bancarização nas cidades menores do Paraná teve que acontecer através dos Correios e cooperativas. “O Estado deixou de ser o indutor do desenvolvimento e a sociedade teve que se organizar em cooperativas, que hoje, são mais de 200 postos de atendimento no interior. Os bancos, infelizmente não se preocupam com os pequenos municípios e ainda hoje há um número expressivo de localidades que não possuem sequer uma unidade bancária”, afirmou.

Segundo Von der Osten, a sociedade até hoje não aceita ter perdido uma empresa com mais de 70 anos, reconhecida e valorizada pela população num processo absolutamente obscuro. “Percebemos, nestes sete anos, a falta que o Banestado fez e continua fazendo para os paranaenses. Como diria Chico Buarque, `ninguém volta o que acabou’, mas fica uma lição muito importante: quando um governo tiver a impressão de que precisa privatizar uma empresa, precisa, necessariamente realizar estudos e consultar a sociedade. Lerner não tinha certeza. Nós sempre a tivemos certeza de que a privatização era incorreta e desnecessária”, argumentou.

O presidente do Sindicato dos Bancários de Londrina e Região, Geraldo Fausto dos Santos, o “Ceará”, põe na conta dos governantes a privatização do Banestado e outros bancos públicos estaduais. Na década de 90, houve uma enxurrada de governos neoliberais que se infiltraram em algumas das principais unidades da federação, comandadas, segundo Ceará, pelo seu líder-mor, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. “O fato é que na privatização do Banestado, os únicos beneficiados foram o Itaú e as pessoas que participaram desse `golpe’ dado pelos governos neoliberais comandados pela tropa do ex-presidente FHC”.

Para o dirigente, desde o início, o movimento sindical protestou, pois não tinha dúvidas de que o processo de privatização seria desastroso sob todos os aspectos. No Caso do Banestado, segundo Ceará, o agravante foi maior, pois a sociedade perdeu um instrumento que alavancava a economia, agricultura, prestação de serviços, entre outras atividades. “O Itaú preconizava o contrário, ou seja, o banco iria se consolidar e não haveria demissões. A história mostrou exatamente o contrário”, desabafa.

Com 33 anos de atividades bancárias, 26 deles no Banestado, Ceará lamenta a situação de algumas unidades bancárias no interior. “Hoje encontramos agências pioneiras completamente abandonadas, um descaso inaceitável. Como pode um banco que lucra R$ 4 bi por semestre manter agências com apenas um funcionário, sofrendo por cobrança de metas e com medo de trabalhar em locais muitas vezes, completamente isolados? Agora temos um banco caro para a população, com uma infra-estrutura insuficiente e trabalhadores rotineiramente vitimados por LER, síndrome do pânico, distúrbios mentais, entre outros problemas de saúde”.

Ceará lembra com satisfação dos seus tempos de Banestado. “Na década de 80, vivemos o melhor período no banco. Éramos 15 mil funcionários, casa cheia em todos os lugares, e os trabalhadores do Banestado impulsionavam as campanhas salariais, numa época em que o banco estava em grande expansão. Éramos uma grande família e tenho saudades daquela época”, destaca.

Outro trabalhador que se lembra com nostalgia dos áureos tempos do Banestado é Edílson José Gabriel, diretor do Sindicato dos Bancários de Umuarama e Região. Segundo ele, o fato mais marcante na privatização do banco foi o número de trabalhadores bancários que da noite para o dia perderam seus empregos. “As demissões atingiram toda a economia paranaense, pois além dos bancários, houve dispensa de outros profissionais cuja atividade está diretamente relacionada aos serviços bancários, como os vigilantes, por exemplo. No caso de Umuarama, a venda do Banestado para o Itaú teve um impacto fulminante na vida de muitas pessoas”, afirma.

Edílson avalia que o desmonte do Estado começou com a privatização dos serviços públicos. “A venda do Banestado foi, juntamente com a tentativa de venda da Copel e o leilão das rodovias estaduais uma das piores heranças deixadas pelo governo Lerner. A sociedade vai cobrá-lo eternamente por esta atitude”.

Uma das características que diferenciavam o Banestado é o atendimento personalizado para cada tipo de cliente. “No Banestado, tínhamos uma política de levar em conta a situação de cada cidadão. Além disso, possuíamos um maior número de municípios com atendimento bancário. A privatização acabou com os postos de atendimento e a imensa maioria dos pequenos municípios do Paraná ficaram desasistidos, com a população tendo que recorrer a outras formas de crédito. Houve, inclusive, o fechamento de inúmeros PABs nas repartições públicas,” informou, convicto de que infelizmente, não há nada que possa reverter um processo consolidado há sete anos.

Presidente do Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região, Marisa Stédile acredita que a privatização do Banestado foi uma ação deliberada de um grupo político que buscou desde o começo o espólio do patrimônio público e uma de suas principais ações foi ter “entregue” o banco ao Itaú. Segundo ela, o preço pago pela sociedade é alto até os dias de hoje.

“A venda do Banestado causou a evasão da poupança interna para outros estados e até para o exterior, já que muitos bancos estrangeiros passaram a atuar no Brasil”, explicou, lembrando que o próprio Bamerindus, banco privado paranaense fôra vendido para o inglês HSBC três anos antes da privatização do Banestado.

É importante destacar que em 1995, houve a chamada internacionalização do sistema financeiro, através da chamada “Exposição de Metas 311”, um documento onde o então presidente FHC tentava justificar o fim das restrições para a entrada dos bancos estrangeiros no Brasil. Entre os pressupostos, FHC citava novas tecnologias, redução de tarifas e expansão de crédito, fatores que até hoje não se justificaram. O sistema financeiro nacional já possuía uma das mais altas tecnologias, as tarifas não reduziram e a linha de crédito sempre teve um grande alcance, sobretudo nos bancos públicos.

Por trás de todo o processo, dois elementos contribuem para causar insatisfação e frustração no movimento sindical. A forma impositiva como as coisas se sucederam durante a privatização e a obscuridade do processo. “O banco não levou em conta o número de trabalhadores que seriam afetados. Só de casais que trabalhavam nas agências bancárias eram mais de 1.500, que perderam o emprego juntos”, destaca Marisa. “Até hoje, não houve qualquer tipo de punição ou esclarecimento. As CPIs instaladas na Assembléia e na Câmara não investigaram o processo, mas apenas as contas CC-5. As falcatruas geradas pelo processo como por exemplo, escolha dos bancos avaliadores, jamais foram punidas.”

À frente do Sindicato de Curitiba e Região, Marisa Stédile conta que o sindicato até hoje dá suporte a ex-trabalhadores do Banestado que, simplesmente não conseguiram se encaixar em nenhuma outra atividade profissional. Ela também não vê possibilidade de o debate ser retomado. “Muitos até sobrevivem da economia informal. Foi um abandono total do banco, mas o sindicato tem dado todo o apoio possível. Infelizmente, nada mais há o que se fazer, pois falta determinação e vontade política para se tomar uma atitude mais drástica. Até porque, como os deputados poderiam fazer uma nova e mais profunda investigação, se eles próprios consentiram que isso acontecesse?,” questiona.

O fato é que passados sete anos, o Banestado não existe mais. Sua privatização mancha as páginas de uma história de luta de uma das categorias mais aguerridas do país. A sociedade paranaense está de luto neste 17 de outubro. A categoria bancária até hoje contabiliza as perdas de uma de suas mais importantes instituições.

O Banestado completaria 80 anos em 2008 levando o desenvolvimento a todas as regiões do Estado. Não é o que vai acontecer. Sua privatização tirou o emprego e o sono de milhares de paranaenses. Alguns não tiveram forças pra lutar. Outros permanecem na luta. Paradoxalmente, a maior parte dos parlamentares que participaram e votaram a favor do leilão do Banestado mantém seus mandatos na Assembléia Legislativa do Paraná ou se elegeram para outros cargos públicos. Mais que um fato, uma triste constatação.

Fonte: Edson Junior – Fetec PR

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