Pouco dos recursos do compulsório liberados financia a infraestrutura

Leandra Peres e Carolina Mandl
Valor Econômco

Os bancos sacaram quase integralmente os R$ 15 bilhões do programa que permitiu o uso de parte dos depósitos compulsórios em alguns tipos de operações de crédito. Apesar do claro apetite das instituições financeiras, boa parte do dinheiro passou longe do financiamento à infraestrutura, principal objetivo do governo, e foi mesmo destinado a operações de curto prazo.

O jornal Valor Econômico apurou que tanto os bancos públicos quanto privados buscaram investir em operações de crédito os recursos que estavam depositados no Banco Central (BC) sem receber qualquer tipo de remuneração. O saldo remanescente hoje é “irrisório”, segundo fontes, e se refere a apenas uma instituição federal.

Passada essa primeira fase do programa, não há intenção no governo de ampliar o valor dos saques permitidos contra os depósitos compulsórios. Não faria sentido, segundo uma autoridade, liberar compulsórios num momento em que o BC sobe juros e que a política fiscal se mantém expansionista.

Um ano atrás, em dezembro de 2012, o governo autorizou os bancos a sacar o dinheiro dos depósitos à vista para uma série de operações de crédito, incluindo o financiamento de programas de inovação tecnológica e produção de bens de capital, entre outras modalidades.

A norma do BC permite que o valor dos financiamentos concedidos com condições iguais às do Programa de Sustentação ao Investimento (PSI) seja descontado do montante que os bancos são obrigados a recolher ao Banco Central sobre depósitos à vista.

Dos 44% dos recursos à vista que as instituições financeiras são obrigadas a recolher, até 20% podem ser alocados para esse tipo de transação.

Com uma lista de quase 20 modalidades de financiamento enquadradas no PSI, um banco privado ouvido pelo Valor, por exemplo, optou por financiar bens de consumo destinados à exportação.

A escolha do banco se deveu ao prazo mais curto desse tipo de operação, que só pode ser financiada em até 36 meses. “Não dá para usar recursos de depósito à vista, que podem ser sacados a qualquer momento, para financiar projetos de infraestrutura”, afirmou à reportagem um executivo de um banco privado.

O financiamento de bens de capital é uma modalidade que pode ter prazo de financiamento de até 30 anos, segundo a circular do BC.

A preocupação dos banqueiros com o descasamento de prazos chegou a ser levada ao governo. O pleito dos bancos era que houvesse liberação de recursos dos depósitos a prazo para o financiamento de projetos de infraestrutura.

Outra demanda dos bancos é que houvesse uma garantia de que as regras do Banco Central não fossem alteradas no meio do caminho, privando os bancos dos recursos do compulsório que foram aplicados em operações de mais de uma década.

Apesar de os bancos não se sentirem confortáveis para usar os recursos do compulsório para muitas modalidades de crédito, principalmente infraestrutura, o programa agradou o setor. “É melhor do que o dinheiro ficar parado”, disse o executivo.

Quando o compulsório sobre depósitos à vista é recolhido ao BC, o governo não paga qualquer remuneração aos bancos. Já nos empréstimos feitos com recursos do compulsório, replicando operações do PSI, os juros variam de 3,5% a 8% ao ano, dependendo do destino do dinheiro.

No início de abril, o governo também isentou as operações do PSI do pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). O objetivo, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse à época, era “tornar mais competitivos os créditos bancários”. As instituições privadas vinham reclamando que, mesmo com o uso do compulsório, ainda saíam perdendo na comparação com os bancos públicos, que têm funding mais barato.

A oferta de empréstimos baseada na liberação de depósitos compulsórios foi anunciada como um dos mecanismos que o governo preparava para aumentar a participação dos bancos privados no financiamento de longo prazo, especialmente de obras de infraestrutura do programa de concessões federais.

A proposta do governo incluía também a formação de fundos de participações e de investimentos em que parte dos recursos pudesse ter origem no setor privado. Não houve, no entanto, avanço nessa direção e o fundo prometido nunca saiu do papel.

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