MPT aciona Odebrecht por trabalho escravo e tráfico de pessoas em Angola

O Ministério Público do Trabalho (MPT) em Araraquara (SP) pede na Justiça a condenação do grupo Odebrecht em R$ 500 milhões por dano moral coletivo. A empresa é acusada de submeter trabalhadores à condição análoga à de escravo em construção de usina de cana-de-açúcar em Angola, na África.

O grupo, formado pela Construtora Norberto Odebrecht S.A., pela Olex Importação e Exportação S.A. e pela Odebrecht Agroindustrial S.A. (antes chamada ETH Bioenergia), também responde por aliciamento e tráfico nacional e internacional de seres humanos.

A ação civil pública foi ajuizada pelo procurador do Trabalho Rafael de Araújo Gomes. O grupo começou a ser investigado pelo MPT após publicação de uma série de reportagens pela agência internacional de notícias BBC, que mencionava a existência de inúmeras condenações da empresa por exploração de trabalhadores brasileiros em Angola.

As notícias davam conta de que os operários teriam sido contratados na cidade de Américo Brasiliense, a 298 km de São Paulo, para trabalhar em obras da Companhia de Bioenergia de Angola Ltda. (Biocom). As contratações ocorreram entre 2010 e 2014.

A Biocom tem como sócios a Odebrecht Angola, do grupo multinacional brasileiro Odebrecht; a Sonangol Holdings Ltda., vinculada à estatal petrolífera de Angola, e a Damer Indústria S.A. (companhia privada que tem em seu quadro societário dois generais e o vice-presidente de Angola). A Damer foi substituída pela Cochan S.A.

Aliciamento

Os trabalhadores foram aliciados em território nacional e seguiram para o exterior. Os operários foram recrutados nas cidades de Cocos (BA), São José da Lage (AL), União dos Palmares (AL), Alto Piquiri (PR) e Alto Araguaia (MT) e depois encaminhados para Américo Brasiliense e São José da Barra (MG).

A prática é conhecida como ‘marchandage’, isto é, uma mera intermediação de mão de obra, que caracteriza a contratação de uma pseudoempresa, no caso, a W. Líder e a Pirâmide Assistência Técnica Ltda, formalmente, uma prestadora de serviços da Biocom.

Para o MPT, empresas como a W. Líder tem a função de arregimentar os trabalhadores, fazer a intermediação de mão de obra, alugar operários, colocá-los à disposição da Biocom/Odebrecht e da coordenadora da montagem, a Planusi.

“O aliciamento em território brasileiro constituiu, entretanto, apenas o primeiro passo de uma rede voltada ao tráfico de seres humanos, pois a ele se seguiu o aliciamento, ainda mais grave, de trabalhadores para o exterior, cometido de forma gritantemente fraudulenta”, afirmou Rafael de Araújo Gomes.

O inquérito do MPT aponta que as empresas enviaram ofícios à Embaixada de Angola pedindo vistos ordinários, válidos por apenas 30 dias, sendo que a permanência dos operários em solo angolano era sempre por período indeterminado.

‘Marchandage’

Na ação, o MPT também pede que o grupo Odebrecht não utilize, nos empreendimentos no exterior, mão de obra contratada no Brasil e enviada ao país estrangeiro sem visto de trabalho, além de não promover o chamado ‘marchandage’.

Além disso, o MPT requer a condenação do grupo Odebrecht ao não recebimento de incentivos e empréstimos concedidos por qualquer órgão público ou instituição financeira pública, inclusive o BNDES. Por fim, com base na Lei 12.846/2013, requer a aplicação de multa no valor de 0,1 a 20% do faturamento bruto das empresas.

As provas produzidas nas dezenas de reclamações trabalhistas movidas contra a Odebrecht e a Pirâmide Assistência Técnica Ltda. (formalmente, uma prestadora de serviços da Biocom) revelam que os trabalhadores envolvidos em montagens industriais eram submetidos a condições indignas de trabalho.

Em depoimentos prestados à Justiça, os empregados relataram que os ambientes na obra eram muito sujos e os banheiros, distantes do local de trabalho, permaneciam sempre cheios e entupidos, obrigando-os a evacuar no mato.

Fome e doença

Os relatos revelam, ainda, que a água consumida era salobra e a comida, estragada. Nas refeições, era servida uma carne vermelha que, segundo o próprio cozinheiro, era de jiboia. Na cozinha do refeitório havia baratas e ratos. Um dos operários desistiu de comer no local após se deparar com um macaco nas instalações, pois sabia que o animal seria morto e servido como alimento aos trabalhadores.

Na obra havia, em média, 400 trabalhadores registrados em Américo Brasiliense pela Pirâmide. Resultados de exames médicos de trabalhadores que retornaram de Angola, encaminhados pelo Departamento Municipal de Saúde da Prefeitura de Américo Brasiliense, mostram que vários operários apresentaram febre, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia, náuseas, fezes com sangue, emagrecimento, e alguns apresentaram suspeita de febre tifoide.

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