Kennedy cogitou ação armada para depor presidente João Goulart

Semanas antes de ser assassinado no Texas, em novembro de 1963, o presidente americano John Kennedy indagou em reunião na Casa Branca se os Estados Unidos poderiam “intervir militarmente” no Brasil para depor o presidente João Goulart.

A pergunta de Kennedy, feita ao embaixador americano no país, Lincoln Gordon, é reveladora de como os EUA cogitavam uma ação armada para ajudar os golpistas a derrubar o presidente brasileiro.

A ação, contudo, acabou sendo desnecessária: bastou o apoio diplomático norte-americano para tornar bem-sucedida a conspiração que derrubou o governo de João Goulart entre 31 de março e 1º de abril de 1964, instaurando uma ditadura militar que duraria 21 anos.

A indagação de Kennedy, documentada em uma gravação realizada pelo próprio americano, foi revelada ontem pelo site “Arquivos da Ditadura” (www.arquivosdaditadura.com.br), que foi ao ar com documentos sobre o período reunidos ao longo de décadas pelo jornalista Elio Gaspari, colunista da Folha.

A informação é uma das novidades da reedição de “A Ditadura Envergonhada”, primeiro volume da série de Gaspari. Ao contrário do que muitos pensavam, a posição americana em relação ao golpe brasileiro foi definida por Kennedy, e não por seu sucessor, Lyndon Johnson, que prontamente reconheceu o governo golpista em 1964.

Em reunião realizada na Casa Branca nos dias 7 e 8 de outubro de 1963, John Kennedy e seus principais assessores discutiram o futuro de Brasil e Vietnã. Sobre a mesa, a possibilidade de golpes de Estado nos dois países.

No dia 7, Kennedy conversou longamente sobre a situação brasileira com o embaixador Lincoln Gordon, que servia no Brasil desde 1961 e era um frequente interlocutor dos conspiradores.

Após ouvir do embaixador sobre o cenário no Brasil, Kennedy o indaga: “Você vê a situação indo para onde deveria, acha aconselhável que façamos uma intervenção militar?”. O embaixador afirma que eles trabalhavam com um cenário de intervenção caso Jango desse uma guinada à esquerda.

Quarenta e seis dias após a reunião, Kennedy seria assassinado a tiros em Dallas, Texas. Assumiria o vice Lyndon Johnson, que apenas seguiu com o roteiro já definido pelo antecessor.

Como se sabe, a intervenção americana não foi necessária. Os EUA fizeram a operação “Brother Sam”, em que disponibilizou apoio logístico para o caso de guerra civil.

“Lyndon Johnson apenas deu o sinal verde, o Kennedy já tinha deixado tudo pronto”, afirmou o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira.

Para o também historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a gravação da reunião em Washington confirma o teor de outros documentos que mostram como o golpe brasileiro era incentivado pelos EUA pelo menos desde 1962.

O site “Arquivos da Ditadura” foi elaborado pela editora Intrínseca, que a partir de fevereiro relançará os quatro livros que Gaspari escreveu até agora sobre o período.

Os documentos foram usados pelo jornalista para escrever os livros. É a primeira vez que esse arquivo é disponibilizado na internet.

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