Bancos testam as agências ‘light’, sem dinheiro no caixa

Wagner Esteves de Almeida é gerente de uma agência bancária do Bradesco na favela de Paraisópolis, em São Paulo, que não tem dinheiro. Nem um mísero centavo entra ou sai dali. Não é por conta disso, porém, que o estabelecimento é menos popular.

É só Almeida colocar os pés na rua para se ter uma amostra. Em tempos de eleição, o gerente mais parece um candidato a vereador percorrendo o sobe-e-desce das estreitas ladeiras de Paraisópolis, de tantas demandas que recebe pelo percurso: “Meu cartão chegou?”, “Wagnão, já posso pegar o contrato na agência?”, “Preciso falar contigo. Vai estar lá à tarde?”.

Almeida é gerente de um novo modelo de agência que os bancos estão testando depois que o Banco Central (BC) lançou uma regulamentação em abril. Além de não precisar ter guichês de caixas para sacar dinheiro ou para receber o pagamento de contas, pode ser instalado onde a instituição financeira quiser e até funcionar em horário diferente do padrão das 10h às 16h. São os chamados postos de atendimento. Na unidade de Paraisópolis, Almeida abre contas, pede cartão de crédito e contrata empréstimos.

Os bancos estão enxergando nisso um jeito mais barato de chegar a locais onde não estão, um dos objetivos do BC com a regulamentação dos postos. Mexer com dinheiro é uma atividade cara. Envolve segurança, portas especiais, cofres e alarmes, o que, segundo o Santander, torna o custo de um posto sem dinheiro 30% inferior ao de uma agência padrão. Pelas contas do Banco do Brasil, para abrir uma agência padrão, é preciso investir pelo menos R$ 1,2 milhão na parafernália anti-assalto.

Em Paraisópolis, a estrutura do Bradesco não tem nada disso. Lá, uma sala alugada de 12 m2, ar-condicionado, duas mesas, meia dúzia de cadeiras de plástico e dois funcionários são suficientes para o banco fazer negócios. Não há um guarda sequer na porta.

Até poucos meses atrás, eram raras as condições em que o Banco Central permitia aos bancos abrir uma unidade sem guichês de caixa, ou só com parte dos serviços que prestam. Só podiam oferecer um atendimento parcial em cidades que não contassem com nenhuma agência bancária de nenhum banco ou dentro de empresas. Nos novos postos de atendimento, a única exigência é que uma placa informe o que é possível fazer ali e onde podem ser encontrados os demais serviços.

Serviços como o recebimento de contas para o público em geral e transferências de dinheiro são tarefas que a cada dia ficam mais longe das agências. São os correspondentes bancários – estabelecimentos comerciais que fecham parcerias com instituições financeiras -, os caixas eletrônicos, o telefone e a internet que assumem essa função. Nada mal em tempos em que os bancos buscam melhorar seus indicadores de eficiência, com mais receitas e menos gastos.

“As pessoas vão passar a ir às agências para fazer negócios. O resto, podem fazer sem sair de casa”, diz Altair Antônio de Souza, diretor adjunto do Bradesco. Na rede, os gerentes vão vender seguro, oferecer crédito imobiliário ou, por que não, um controverso título de capitalização?

Os novos postos de atendimento serão particularmente usados em municípios pequenos. “Temos uma agência completa em Uru, uma cidade com 1,2 mil habitantes no interior de São Paulo. Com o novo modelo de posto de atendimento, já seria possível atender várias populações desse porte”, diz Pedro Coutinho, vice-presidente do Santander. Uma das alternativas estudadas pelo banco para cidades de pequeno porte onde não está presente é o atendimento gerencial com horário marcado, algumas vezes por semana.

Talvez alguém que more em Uru ou em São Paulo, já acostumado a ir à agência de segunda a sexta-feira das 10h às 16h, não se entusiasmasse com a novidade. Mas, para quem nunca teve uma agência completa na esquina de casa, os novos postos de atendimento podem trazer algum alívio.

Até o fim do ano, o Banco do Brasil vai abrir postos de atendimento em dez pequenas cidades, como Alpestre (RS), de 8 mil habitantes. Em 2013, serão pelo menos outras 62. “Antes, ou o banco abria uma agência, ou não abria. Agora, a nova regra permite que os bancos cheguem a locais com potencial econômico pequeno, que não eram viáveis pelo antigo padrão”, diz Hideraldo Dwight, diretor de clientes do Banco do Brasil. Pela avaliação do banco, uma agência só se viabiliza financeiramente em cidades com mais de 15 mil habitantes.

Gente de menos não é o problema de Paraisópolis. A favela tem uma população estimada em cem mil habitantes. Mas os clientes do Bradesco eram atendidos por uma agência não muito longe dali, na avenida Giovanni Gronchi, no bairro do Morumbi, a cerca de 1,5 km do novo posto de atendimento. Seja por preguiça, acanhamento ou dificuldade de transporte, muitos não chegavam lá.

“Agora abro em Paraisópolis muito mais contas correntes por mês do que muita agência do Bradesco por aí. Meus concorrentes que não me ouçam”, diz o gerente Almeida, que antes de Paraisópolis já atendia há três anos a população da favela por meio da agência do banco no Morumbi. Ainda manteve o hábito de usar terno e gravata, traje que contrasta com a paisagem de Paraisópolis. De resto, já incorporou o “modus operandi” da favela, o que fica claro na informalidade das conversas que tem com os moradores. “Mantive a roupa porque faz parte do meu estilo.”

Dona da Mira Modas Butique, mais conhecida como a “Daslu de Paraisópolis”, Miralva Miranda de Oliveira não estranha o visual de Almeida e comemora que agora já pode aposentar o carro para ir ao banco. “Está bem mais fácil. Qualquer problema, dou um pulinho a pé lá no posto do Wagner”, diz a baiana, consumidora de linhas de capital de giro do Bradesco.

O novo modelo de ponto de atendimento, porém, não serve apenas para a inserção em comunidades mais pobres. No shopping Iguatemi JK, o mais recente templo do consumo luxuoso de São Paulo, o Bradesco abriu um posto de atendimento. Ali, como em Paraisópolis, não há dinheiro. Mas, obviamente, o objetivo tampouco é abrir a primeira conta corrente dos clientes.

Nesse espaço ultra tecnológico do bairro Vila Olímpia, vale oferecer serviços mais sofisticados, como teleconferências com especialistas em investimento, para abastados clientes. Afinal, para aquele público que raramente põe os pés em uma agência bancária tradicional, de nada valeria um guichê de caixa.

Em meio à flexibilização pelo Banco Central, os bancos também aproveitam para inventar novas formas de atender os clientes. No próximo ano, o Banco do Brasil vai testar uma nova agência em plena avenida Paulista, uma das principais vias da capital paulista. Depois de perceber que 80% dos clientes que entram em uma agência naquela via não têm conta ali, o Banco do Brasil vai focar o atendimento no auto-serviço, inclusive com gôndolas para os produtos financeiros. Detalhe: tudo poderá ser comprado em um horário ampliado, que vai além do tradicional expediente bancário, das 10h às 16h.

Debaixo de reclamações sindicais, Itaú Unibanco e Bradesco testam horários alternativos. Em shoppings, as agências já ficam abertas até as 20h, sendo que, a partir de um determinado horário, só atendem correntistas.

Se vai funcionar, é outra questão. “Nos próximos seis, doze meses, os bancos vão fazer uma série de experiências. Ainda não se sabe qual será o modelo vencedor”, diz Dwight, do Banco do Brasil. Miralva, dona da butique de Paraisópolis, já deu as boas-vindas à agência sem dinheiro.

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