Bancos são acusados de enganar aposentados e pensionistas no Maranhão

O Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), da Defensoria Estadual do Maranhão, ajuizou ação civil pública contra cinco bancos para combater ilegalidades e reparar danos a aposentados e pensionistas que contrataram cartões de crédito com reserva de margem consignável (RMC) acreditando terem celebrado um empréstimo consignado. O equívoco gerou sérios prejuízos financeiros ao consumidor.

Aproximadamente 900 pessoas, entre aposentados, pensionistas e servidores municipais com renda de até três salários mínimos possuem este tipo de contrato. No Estado, esse número chega a quase quatro mil pessoas.

“Nas relações de consumo, a utilização da expressão ‘comprar gato por lebre’ indica que a pessoa adquiriu um produto ou serviço quando, na verdade, solicitou e pretendia outro, isto é, foi enganada. O engano tanto pode decorrer da ausência de uma informação importante quanto da existência de uma informação incorreta. E isso é bastante comum em se tratando de empréstimos consignados”, explicou Jean Carlos Nunes Pereira, titular do Núcleo de Defesa do Consumidor.

Inicialmente, foram registradas quatro reclamações de consumidores relatando haver realizado um empréstimo consignado e que, apesar de longos anos de pagamento, as parcelas não cessavam.

Um dos casos atendidos no Nudecon foi o da idosa Maria Neuza Silva de Amorim, que relatou ter realizado empréstimo consignado no valor de R$ 800 no banco BMG, em fevereiro de 2009. Desde então, a senhora tem sido alvo de descontos em folha no valor de R$ 62,20.

Quando o Núcleo oficiou ao banco, solicitando informações, a instituição explicou que, depois de cinco anos, o saldo devedor de dona Maria Neuza seria de R$ 537,86.

“Todos os demais casos que acompanhamos evidenciam a mesma prática abusiva. Reforça esse quadro o fato de a maior parte dos consumidores contratantes ser de baixa renda e, normalmente, de baixa escolaridade, além disso, há um valor da parcela descontada em folha, o que leva a crer que o cliente está sanando gradativamente sua dívida”, disse, acrescentando que o fato de ter idosos entre os assistidos o Nudecon solicitou prioridade no julgamento desta demanda.

Ao buscar respostas junto às instituições financeiras, os defensores tomaram conhecimento de que em verdade os reclamantes não haviam celebrado um empréstimo consignado, mas um cartão de crédito com reserva de margem consignável.

Embora, em ambos os tipos de contrato, seja possível a obtenção de empréstimo, no caso do consignado a taxa de juros é, normalmente, a metade da aplicada no cartão de crédito com reserva de margem.

As diferenças, porém, não esbarram aí. No consignado, o cliente efetua o empréstimo já com data certa para início e término das parcelas; ao passo que no cartão de crédito com reserva de margem não há data limite para o término do pagamento e os juros duas vezes maiores.

“Além disso, o fato de os descontos em razão da obtenção de empréstimo por meio do cartão serem efetuados diretamente no contracheque do consumidor o induz a acreditar que fez um consignado como outro qualquer. Como as parcelas são baixas (o desconto somente alcança 10% da remuneração do servidor, aposentado ou pensionista), ele somente se dará conta do mal negócio que fez quando perceber, após longos anos, que já pagou três ou quatro vezes o valor solicitado e não há previsão para o término das parcelas”, explica Jean Carlos Nunes Pereira, titular do Núcleo de Defesa do Consumidor.

A Defensoria constatou outras ilegalidades. Segundo o defensor Jean Carlos Nunes Pereira, em regra, “os contratos de cartão de crédito com reserva de margem consignável-RMC não estão assinados em todas as páginas pelos consumidores e nem a estes entregues, não possuem informações básicas como taxas de juros e data de término das parcelas. Além disso, são utilizados, em regra, para obtenção de saques ou empréstimos, o que é expressamente vedado por normas municipal e federal”.

Outras medidas

Essa ação judicial resulta das provas colhidas numa série de medidas e ações tomadas pelo Núcleo de Defesa do Consumidor em parceria a Escola Superior da Defensoria Pública e do Centro Integrado de Apoio e Prevenção à Violência contra o Idoso (Ciapvi), com o Proncon e a Secretaria Municipal de Administração (Semad), das quais resultou o atendimento de dezenas de idosos, aposentados e pensionistas do Município, que realizaram saque ou obtenção de empréstimo por meio do aludido cartão.

Suspeitando que a prática ilegal poderia estar ocorrendo também em relação a aposentados e pensionistas do INSS, o órgão foi oficiado e a Defensoria Pública da União instaurou procedimento de tutela coletiva para apurar o caso no âmbito federal.

“Realizamos um árduo trabalho de levantamento de informações, oficiando também a todos os bancos citados pelos consumidores. Estamos dando atenção aos casos envolvendo os cidadãos que recebem até três salários mínimos, mas acreditamos que o número de consumidores lesados é muito maior. Na Ação Civil Pública, sustento que os bancos não cumpriram com o dever de informação e de esclarecimento, violaram princípios da boa-fé, além de princípios da livre concorrência. Trata-se de uma ilegalidade que não pode ser mais tolerada e é nosso dever dar um basta nisso, alertando toda a sociedade para não permitir mais esse abuso”, finalizou o defensor público Jean Carlos Nunes Pereira.

Entenda como funciona a prática

O cliente busca o representante do banco com a finalidade de obtenção de empréstimo consignado e a instituição financeira, nitidamente, ludibriando o consumidor, realiza outra operação: a contratação de cartão de crédito com RMC.

Na sua folha de pagamento será descontado apenas o correspondente a 6% do valor obtido por empréstimo e o restante desse valor e mais os acréscimos é enviado para pagamento sob a forma de fatura que chega mensalmente à casa do consumidor.

Se este pagar integralmente o valor da fatura, que é o próprio valor do empréstimo, estará quitada a dívida; se, entretanto, como ocorre em quase todos os casos, o pagamento se restringir ao desconto consignado no contracheque (6% apenas do total devido), sobre a diferença não paga, isto é, 94% do valor devido, incidirão juros que são duas vezes mais caros que no empréstimo consignado normal.

Jean Carlos esclarece que, na prática, todos os meses em que a fatura não é paga em sua integralidade ocorre novo empréstimo e incidem juros sobre juros.

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