ARTIGO: A‡äes de Solidariedade

(São Paulo) Veja abaixo o discurso da diretora da Contraf-CUT, Neide Fonseca, que é presidente da UNI Américas Mulheres, pronunciado durante a 2ª Conferência Regional da Uni-Américas, realizada este mês em Mar Del Plata, Argentina

 

O sofista Protágoras afirmava que “O homem é a medida de todas as coisas, das que são o que são e das que não são o que não são”.

 

É na raiz desse pensamento, de que o homem bastava por si só, que o individualismo se consolidou e durante muito tempo o egoismo e a miséria humana conviveram ao lado da concentração de riqueza, sem que o Estado fizesse algo para diminuir o crescimento da injustica social.

 

No período Pós Revolução Industrial se constata que buscar defender de forma associada, em grupo, é uma estratégia eficaz para se atingir objetivos. Entram em cena os sindicatos que lutam para corrigir as graves distorções proporcionadas pelo Estado Liberal e pela Revolução Indústrial.

 

O valor da solidariedade é diametralmente oposto aos valores defendidos pela teoria individualista. No individualismo o foco central é o Lucro. Na solidariedade o Ser Humano é o foco central. E é na solidariedade entre trabalhadores e trabalhadoras do mundo todo que está a possibilidade de mudanças. Com sindicatos fortes, combativos, que além da perspectiva classista tenham a perspectiva de gênero, raça e etnia que são três pilares estruturantes do mundo do trabalho.

 

A Uni Américas tem consciência de que a solidariedade só é efetiva quando praticada a tempo, e por isso o tema da Confêrencia é “Construindo juntos nosso futuro”. Neste sentido, quero destacar sete pontos onde devemos intensificar ou iniciar Ações de Solidariedade:

 

Sabemos que a globalização somada a revolução da Tecnologia da Informação tem grande impacto nas intensas lutas realizadas pela igualdade de gênero. Neste sentido, no primeiro ponto, destaco que é preciso empenhar nossa solidariedade as pessoas que trabalham nas Maquilas, onde 80% são mulheres entre 14 e 25 anos.

 

O modelo de maquiladoras das corporações multinacionais exploram mão de obra barata e gozam de vários benefícios do chamado livre comércio, para elevar seus lucros.

 

Com um discurso estereotipado de que as mulheres são mais delicadas, mais  pacientes, etc., os empregadores dizem que empregam mulheres pelas habilidades manuais, pela cooperação, etc. Entretanto, sabemos todos nos, que o uso da mão-de-obra feminina é motivado pelo único desejo de diminuir os custos.

 

Nas maquilas os salários são baixos, os locais insalubres, a jornada de trabalho chega a ser de 14 horas sem pagamento de hora-extra, aplicação de testes para detectar gravidez, violação da lei sobre maternidade e tempo para amamentação, estupros e até assassinatos.

 

Em dezembro de 2000, um Boletim da Rede de Solidariedade das Maquilas, revelaram que mais de 300 operárias entre 15 e 25 anos foram violadas e assassinadas em Ciudad Juarez.

 

O avanço acelerado das Maquilas na América Latina apresenta um quadro desesperador, todos os direitos humanos fundamentais e sindicais são violados. Hoje as maquilas nessa região representam 20% do PIB Indústrial.

 

O segundo ponto que penso merecer toda nossa solidariedade é em relação ao processo de mercantilização da vida, imposta pelas corporações empresariais, com o tráfico de mulheres, crianças e adolescentes, que já se tornou a terceira maior fonte de riqueza, numa regressão total aos Direitos Humanos.

 

O terceiro ponto se refere à globalização financeira e o modelo neo liberal que produziu transformações e impactos negativos na vida de todos os trabalhadores, mas em especial às trabalhadoras.

 

Dos 800 milhões de habitantes do planeta considerados miseráveis, 70% são mulheres. A ONU estima que o valor global do trabalho não remunerado das mulheres atinja 11 bilhões de dólares anuais.

 

Na América Latina, 23% das trabalhadoras recebem menos de 1 Salário Mínimo contra 11% dos assalariados homens. O ideal é que todos e todas recebessem mais e igual por trabalho de igual valor.

 

Entretanto, para o mesmo trabalho uma mulher branca jovem ganha 55% do que ganha um homem branco jovem. O jovem negro ganha 47% do que ganha o jovem branco, e a jovem negra ganha apenas 24% do que ganha o mesmo jovem branco para o mesmo trabalho.

 

Por isso, a luta por salário igual para trabalho de igual valor, conforme a Convenção 100 da OIT, transversalizado por raça e etnia, deve ser um ponto fundamental nas negociações coletivas e nos Acordos Macro Globais.

 

Passemos para o quarto ponto. Raça é um conceito ideológico utilizado para hierarquizar os diversos grupos sociais e tem servido ao longo do tempo, no mundo do trabalho, para rebaixar o nível salarial, quando temos que aos trabalhadores negros e as trabalhadoras negras sempre pagam o menor salario, e ocupam os cargos menos qualificados, e mesmo quando têm o mesmo nível de instrução o salário chega a ser 40% menor. Mas quero me ater à etnia que é um conceito antropologico.

 

A população índigena na América Latina é de 50 milhões de pessoas divididas em 400 grupos etnicos que sofrem discriminação  e sobrevivem em condições de marginalidade.

 

A globalização economica agudizou os processos históricos de marginalização social dos indígenas, enquanto no plano cultural há um processo de homogeneização que violenta a cidadania índigena.

 

As condições de trabalho  são as piores possíveis com salários inferiores  e os direitos trabalhistas violados.

 

O quinto ponto para o qual peço solidariedade é em relação à transversalidade entre gênero, trabalho e violência. Penso que todos e todas que aqui estamos valorizamos um desenvolvimento com paz, onde todos os direitos humanos e a dignidade da classe trabalhadora no contexto global sejam respeitados.

E certo que muitos elementos econômicos e políticos da violência de gênero estão relacionados à liberalização do comércio. A UNI vem desenvolvendo com sucesso a Campanha “Alto à Violência contra a mulher”, mas neste momento me refiro a que façamos ações de solidariedade nos paises em conflitos armados ou em guerra.

 

O impacto da guerra sobre a vida das mulheres é diferente do impacto para os homens, por razões biológicas, psicológicas e sociais.

 

Em geral os homens sofrem a morte. As mulheres sofrem humilhações, violências sexuais, gravidez forçada, são infectadas deliberadamente pelo HIV-AIDS.

 

A violência contra a mulher é utilizada como estratégia de guerra. Um exemplo disso é o conflito armado na Colômbia, na luta pelo controle de territórios e comunidades em distintas zonas.

 

Além disso raça e etnia quando somado ao fato de ser mulher se tornam agravantes. Ainda citando a Colômbia, como exemplo, quando se é indígena ou afrocolombiana tudo fica pior. Conversando com Leonor, ela me disse que se for mulher, afrocolombiana e sindicalista só resta uma alternativa: a morte.

 

O sexto ponto onde devemos intensificar ações de solidariedade é contra a xenofobia que sofrem os trabalhadores (as) imigrantes. Não é possível permitir que as diferenças se transformem em desigualdades de tratamento. No caderno temático, vamos encontrar algumas ações propostas por mim, então peço que leiam para que eu não tome mais o tempo de vocês.

 

Por fim, mais não menos importante, penso que devemos ter ações de solidariedade em relação aos trabalhadores (as) homossexuais, que por sua orientação sexual tem seus direitos trabalhistas desrespeitados.

 

Na quarta-feira lia na Internet que na Polônia se estuda uma Lei para vetar (proibir) aos professores homossexuais trabalharem, e além disso prevêem perseguições a todos os que se proponham a falar ou falem sobre o assunto homossexualidade.

 

Nas Américas não é diferente: O chefe das forças armadas dos E.U. declarou que a homossexualidade é algo imoral. No Perú, a mãe do candidato a presidência, Ollanta Humala, disse que se estivesse no poder “fuzilaria a todos os homossexuais, porque são aberrações”. No Brasil, um homossexual é assassinado por dia pelo unico motivo da sua orientação sexual, embora. agora no governo Lula tenhamos Lei que protegem aos homossexuais.

 

Quero encerrar enfatizando que ao contrário do pensamento individualista de Protágoras, que retorna com força total na sociedade de nossos dias, devemos colocar o ser humano como centro de nossas ações, invertendo a lógica do Capital. Assim desde os nossos sindicatos locais até nosso sindicato global que é a UNI, devemos fazer do nosso discurso uma prática constante. Ao fim dessa segunda Conferência, é preciso mãos  à obra (ao trabalho), vamos Juntos e Juntas construir uma nova América para que o futuro de homens e mulheres, jovens e idosos, crianças e adolescentes, a que raça ou etnia pertencer,  seja bem diferente do que é agora.

 

 Neide Fonseca é diretora da Contraf-CUT e presidenta da Uni –Américas Mulheres

Compartilhe:

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp
Compartilhar no telegram
Telegram