A questão das regras da caderneta de poupança

No atual cenário de crise do Capitalismo, que se caracteriza pelo encarecimento do crédito internacional, falência de grandes instituições financeiras, redução da atividade econômica e ampliação do desemprego, o Estado brasileiro tem uma grande oportunidade para recuperar o papel de agente ativo na condução da política econômica ao manter a trajetória de redução da taxa básica de juros (Selic).

Esta redução já coloca o país numa situação praticamente inédita em termos de taxas de juros nominais e reais bem menores do que o vivido em muitos anos.

Além disso, decisão do Conselho de Política Monetária (COPOM) do Banco Central em reduzir em 1% a taxa básica no dia 29 de abril de 2009, levando-a para 10,25% ao ano, recoloca uma questão polêmica que já esteve em debate no ano de 2007, em torno da proposição de modificações nas regras de remuneração da caderneta de poupança.

Queda dos juros e novas regras em debate

Defendida pelo setor produtivo – lado real da economia, em contraposição aos setores e agentes que se beneficiam das aplicações meramente financeiras – é notório que a política de redução na taxa básica de juros tem um papel fundamental na retomada dos investimentos no processo produtivo, bem como para a recuperação do nível de atividade econômica.

A iniciativa do COPOM, ainda que possa estimular a recuperação do crescimento econômico no segundo semestre de 2009 e ao longo de 2010, pode trazer consigo uma nova preocupação para a equipe econômica do governo diante da proposta de mudanças nas regras da poupança. Mas afinal, como se daria a relação entre a trajetória de queda na taxa básica de juros e a proposta de modificações nas regras da caderneta de poupança? Vamos aos fatos.

Entre o segundo semestre de 2008 e início de 2009 observou-se que a trajetória de queda na taxa básica de juros diminuiu os ganhos dos Fundos de investimentos em renda fixa, que são compostos basicamente por títulos públicos, Depósitos Interbancários (DIs) e Certificados de Depósitos Bancários (CDBs). Isto fez com que as aplicações nesses títulos fossem direcionadas para a caderneta de poupança, não pela alta rentabilidade oferecida, mas pelos ganhos relativamente maiores que nos Fundos, além de outros fatores, como o risco praticamente nulo, bem como pela não incidência do imposto de renda (IR) e do imposto sobre as operações financeiras (IOF).

Principais questões

Diante desse cenário, passou-se a cogitar que o governo implementaria mudanças nas regras de correção da poupança, de modo a evitar a migração em massa dos fundos de renda fixa. Uma das questões que se coloca diz respeito ao financiamento da dívida pública, já que esta migração afetaria os recursos aplicados com tal finalidade em favor de outras formas de aplicações. Por outro lado, o cenário de juros menores estaria evidenciando o peso das taxas de administração cobradas nos títulos e Fundos privados, e que na verdade os torna menos competitivos em relação à caderneta de poupança.

Propostas em discussão

Dadas essas questões, cogita-se que algumas medidas serão tomadas com a implementação de novas regras para a poupança, conforme os levantamentos recentes apresentados pelos jornais e revistas de grande circulação no país. Para tanto, estão sendo estudadas as seguintes propostas pela área econômica do governo:

Tributação: incidir o imposto de renda sobre grandes aplicações, com a criação de diferentes faixas de rendimento. Na prática, quanto maior o volume de recursos aplicados na poupança maiores seriam as alíquotas do tributo.

Novas regras de correção: extinguir a correção da poupança pela Taxa Referencial (TR) e criar uma nova correção a partir da variação percentual da taxa básica de juros (Selic), tal como aplicado nos CDBs.

Teto para aplicações: estabelecer um teto para as aplicações na poupança, tal como feito no caso dos títulos públicos, que tem um limite de R$ 400 mil.

Outros elementos do debate

Enfim, das propostas recentemente levantadas, ainda que submetidas a maiores esclarecimentos, é oportuno que sejam inseridos no debate as altas taxas de administração cobradas pelas instituições financeiras, que alcançam até 6% ao ano de fundos DI (conforme dados apresentados pela Comissão de Valores Mobiliários no Portal do Investidor).

Outro elemento, ainda no cenário de queda de juros, seria a rediscussão sobre o spread bancário, que consiste na diferença entre a captação dos recursos no mercado e os empréstimos efetuados pelas instituições financeiras. De fato, as entidades de classe, a exemplo da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) defendem propostas no sentido de estimular a redução dos spreads cobrados pelos bancos, como forma de garantir taxas de empréstimos menores às pessoas físicas e jurídicas.

Por último, em relação às novas regras, é preciso que sejam consideradas as dúvidas e incertezas trazidas pela mudança. Ademais, embora não se trate do termo “confisco” (alardeada levianamente por “pseudo-espertos” que querem apenas lucrar politicamente, sem qualquer fundamento técnico), as possíveis medidas a serem apresentadas ainda poderá trazer um cenário de incerteza, principalmente entre os pequenos aplicadores. Outro risco possível seria a inviabilidade do financiamento habitacional, já que 65% dos recursos da poupança são alocados para o financiamento imobiliário.

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