Tribunal de Contas da União aprova entrega da Eletrobras ao setor privado

Ministro Vital do Rêgo foi o único a votar contra a privatização, alertando para a subprecificação da estatal, que valeria cerca de R$ 130 bilhões, quase o dobro dos R$ 67 bilhões aprovados pelo TCU

Dando prosseguimento à sua política neoliberal, que propõe o desmonte do estado, o desgoverno de Jair Bolsonaro tenta se livrar de um dos maiores patrimônios do povo brasileiro: a Eletrobrás, a maior empresa brasileira de geração de energia elétrica, com uma produção de cerca de 100 milhões de MWh (Megawatt hora), suficientes para atender a mais de 1/3 do consumo de eletricidade no país.

São 48 usinas hidrelétricas, 14 térmicas, 2 nucleares, 43 parques eólicos e 1 parque solar. Em geração de energia elétrica brasileira, a capacidade instalada da companhia equivale a cerca de 29% do total do país, sendo que cerca de 97% vêm de fontes com baixa emissão de gases de efeito estufa.

No segmento de transmissão de energia elétrica no Brasil, a Eletrobras é responsável por cerca de 44% do total de linhas de transmissão do país em sua rede básica, em alta e extra-alta tensão.

A empresa que o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer entregar ao setor privado, apresenta excelentes indicadores operacionais e é lucrativa: R$ 30,7 bilhões de lucro líquido acumulado entre 2018-2020 e R$ 7,6 bilhões em dividendos distribuídos (2019-2021). Em seu último balanço, realizado no terceiro trimestre de 2021, apresentou um lucro líquido de R$ 965 milhões. A ânsia em entregar as riquezas brasileiras fez com que, no ano passado, Jair Bolsonaro fosse autor da Medida Provisória 1031/21, dispondo sobre a privatização. Aprovada pelo Congresso, a MP possibilita que empresas estrangeiras se apoderem de um bem construído pelo povo brasileiro e pelos mais de 12 mil trabalhadores que constituem a Eletrobras.

No Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro relator, Aroldo Cedraz, deu parecer favorável à venda da estatal. Mas os tecnocratas de Brasília não contavam que um dos ministros, Vital do Rêgo, encontrasse, conforme revelou o jornal Valor Econômico, uma falha grotesca nos cálculos da equipe que formulou a proposta de venda da Eletrobras, um “equívoco” que custaria bilhões que deixariam de ir para os cofres públicos e beneficiariam os novos donos da empresa.

A manobra nos cálculos já havia sido apontada, em nota publicada em outubro passado, pela AEEL – Associação dos Empregados da Eletrobras – e que denuncia a manipulação do CNPE – Conselho Nacional de Política Energética – dos parâmetros para determinar o valor do aumento de capital, reduzindo potencial de arrecadação da operação e beneficiando potenciais novos investidores.

Na publicação, “os empregados consideram que a sociedade brasileira precisa saber que ou o Parlamento aprovou a privatização da Eletrobras sem saber o valor dos ativos da empresa, pois esta informação só seria disponibilizada após a conclusão dos estudos do BNDES que sequer estavam contratados, ou as premissas foram manipuladas, causando prejuízo aos cofres públicos e para os acionistas da Eletrobras”.

As manipulações nos cálculos demonstradas na nota ferem os artigos 70 e 71 da Constituição, pois constituem atos lesivos ao erário com uma renúncia exorbitante de receita pela União. Dessa forma, a AEEL considerou ser urgente que TCU avaliasse as premissas econômico-financeiras adotadas no processo de valoração das outorgas para capitalização da Eletrobras, exigindo que o órgão revisse os erros de cálculo no processo de determinação do valor da outorga, evitando que o processo de privatização apresentasse mais erros, que poderiam ser classificados como atos de improbidade administrativa e lesão ao patrimônio público.

Nesta terça-feira (15), o TCU retomou o julgamento do processo que tratava da privatização da Eletrobras. Após o voto do relator Aroldo Cedraz, a favor da privatização nos moldes propostos pelo governo, o tribunal formou maioria para aprovar a primeira etapa da entrega da estatal ao mercado.

Cedraz foi acompanhado por outros seis ministros, Walton Alencar Rodrigues, Benjamin Zymler, Raimundo Carreiro, Augusto Nardes e Jorge Oliveira. O único ministro da Corte a votar contra a venda da estatal foi o ministro Vital do Rêgo, que defendeu a correção da outorga da Eletrobras em R$ 63 bilhões.

O ministro Vital do Rêgo, que havia pedido vistas e encontrou erros metodológicos no cálculo da outorga, sugeriu que fossem feitas novas contas. Na avaliação de Vital do Rêgo, baseada em estudo feito pela secretaria de infraestrutura elétrica do TCU, o patrimônio da Eletrobras, estipulado em R$ 67 bilhões, seria de R$ 130,4 bilhões. Ausência de precificação para valor futuro da potência das hidrelétricas e de risco hidrológico, são as variantes que, segundo o ministro, levaram à subprecificação da Eletrobras.

O ministro alertou que nenhum país cuja matriz energética possua dependência da hidroeletricidade como parte significativa privatizou seu setor elétrico: Estados Unidos, China, Canadá, Suécia, Noruega, Índia, Rússia. Aqui não se trata de matriz ideológica, aqui não se trata de ponto de vista político, aqui se trata de projeto de estado.

Em seu voto o ministro Vital do Rêgo deixou claro que não é contra a privatização, mas sublinhou que, “as  22 hidrelétricas da Eletrobras, que detém 50% dos reservatórios do Brasil já estão completamente amortizadas. Fazendo uma analogia, é como se uma pessoa pagasse anos a fio as prestações de uma casa e ao final, depois de inteiramente quitada, tivesse que abrir mão de sua casa. O brasileiro sofre hoje com as consequências de pagar a segunda maior tarifa do planeta, levar adiante a desestatização da Eletrobras neste formato significa grandes possibilidades de passarmos a ocupar o primeiro lugar neste nefasto ranking”.

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