Encontro Nacional dos Funcionários do Itaú-Unibanco debate conjuntura, tecnologia e desafios da categoria

Evento em São Paulo reuniu dirigentes sindicais e representantes de base de todo o país nesta sexta-feira (22)

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O Hotel Holiday Inn Parque Anhembi, em São Paulo, recebeu nesta sexta-feira (22) o Encontro Nacional dos Funcionários do Banco Itaú-Unibanco. O evento reuniu 86 dirigentes sindicais e representantes de base de diversas regiões do Brasil para debater temas estratégicos, como o cenário político e econômico, os impactos da inteligência artificial na atividade bancária e questões relacionadas à saúde e às condições de trabalho.

A abertura foi conduzida pela Coordenação da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Itaú-Unibanco e por integrantes do Comando Nacional dos Bancários, que ressaltaram a importância da unidade e da organização da categoria diante dos desafios atuais.

Na análise de conjuntura, a presidenta da Federação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro do Rio de Janeiro (Federa-RJ), Adriana Nalesso, destacou que a tecnologia deve estar a serviço da sociedade e dos trabalhadores. “A tecnologia tem que servir em prol da classe trabalhadora, para garantir mais qualidade de vida. Para isso, vamos fazer o que sabemos: lutar, resistir e avançar”, afirmou.

Adriana também relacionou o atual cenário internacional com a disputa pelas riquezas da América Latina, lembrando que “a reforma trabalhista, o ataque aos direitos e a tentativa de enfraquecer a Convenção Coletiva (CCT) têm ligação direta com os interesses do capital financeiro e das grandes corporações”.

A presidenta da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito de São Paulo (Fetec-SP), Aline Molina, reforçou que a disputa vai além de uma guerra comercial. “Está em curso um movimento de dominação sobre as riquezas da América do Sul, que hoje detém o novo ouro do mundo. Ou lutamos contra o imperialismo ou não teremos condições de trabalhar e viver com dignidade”, alertou.

Segundo Aline, o próximo período será decisivo para o futuro da categoria e do país. “O ano que vem é o ano das nossas vidas. Nossa soberania está verdadeiramente ameaçada, e precisamos reafirmar a luta de classes, combater o imperialismo e construir uma sociedade justa e igualitária para todos”, disse.

Ao longo do encontro, dirigentes ressaltaram que os bancos têm tentado fragmentar a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) para concorrer com fintechs, e que será necessário ampliar a mobilização para preservar conquistas históricas da categoria.

Tecnologia e inteligência artificial: impactos no emprego e no futuro do trabalho bancário

Na sequência, o encontro contou com a participação de Cátia Uehara, economista e técnica da subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) junto ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, que apresentou a palestra “Inteligência Artificial e o Banco Itaú-Unibanco – impactos na Atividade Bancária”.

Cátia analisou as transformações recentes no setor bancário brasileiro, com foco no Itaú Unibanco, impulsionadas pelo avanço tecnológico e pela inteligência artificial (IA). O estudo mostrou o crescimento acelerado das transações digitais, o investimento massivo em tecnologia e a consequente mudança no perfil do emprego, com destaque para o aumento expressivo das ocupações em TI e a redução dos postos de trabalho bancários tradicionais.

Segundo os dados apresentados:

  • O volume de transações bancárias no Brasil superou 200 bilhões em 2024, um crescimento de 8% em relação a 2023, impulsionado pelo mobile banking. Enquanto globalmente o orçamento em tecnologia dos bancos cresceu 35% entre 2018 e 2023, no Brasil o aumento foi de 97% no mesmo período. A participação das ocupações em TI nos bancos privados saltou de 2,7% em 2013 para 12,8% em 2024, chegando a 20% do total de empregados no Itaú.


O Itaú Unibanco, que conta hoje com 17,3 mil funcionários em TI, criou em abril de 2025 o Instituto de Ciência e Tecnologia Itaú, reunindo 80 pesquisadores em projetos de inteligência artificial generativa e computação quântica, em parceria com instituições como Stanford, MIT e USP.

Ao mesmo tempo em que investe na digitalização, o banco tem reduzido sua estrutura física. Entre dezembro de 2014 e junho de 2025, foram fechadas 2.031 agências no Brasil, uma média de 3,5 por semana. No último ano, o Itaú encerrou 223 unidades, enquanto o Bradesco fechou 342 e o Santander 561. Desde 2018, o sistema financeiro brasileiro perdeu 4.853 agências, uma redução de 23,3%.

Essa reconfiguração do setor impactou fortemente o emprego. O Itaú chegou a ter 104 mil trabalhadores em 2009, mas em junho de 2025 o quadro era de 85,7 mil — uma queda de 18,2 mil postos em 14 anos. Em 12 meses, até o fim de 2024, a holding registrou 1,6 mil cortes no Brasil, compensados apenas parcialmente pelo aumento de 1,1 mil vagas em tecnologia.

Os efeitos são ainda mais visíveis no conjunto do ramo financeiro:

  • Em 1994, os bancários representavam 80% dos empregos do setor; em 2024, a participação caiu para 42%.
  • De 2012 a 2024, a categoria bancária perdeu 88,8 mil postos de trabalho, enquanto segmentos como securitários (+88 mil) e cooperativas de crédito (+80 mil) expandiram.
  • Desde 2013, mais de 90 mil vagas bancárias foram eliminadas, com saldos anuais negativos recorrentes.

Apesar dessa redução no quadro de pessoal e do fechamento de agências, os lucros dos grandes bancos seguem em alta. No primeiro semestre de 2025, os três maiores bancos privados somaram R$ 41,6 bilhões, com crescimento médio de 19,8%. O Itaú foi o destaque, com alta de 33,7% em relação ao mesmo período do ano anterior, atingindo R$ 22,1 bilhões.

“Estamos diante de um paradoxo”, avaliou Cátia. “De um lado, um investimento recorde em tecnologia e um discurso de modernização; de outro, o encolhimento das agências, a redução de empregos e a intensificação do trabalho. É fundamental que esse debate esteja no centro da mobilização sindical, para que a inovação não signifique perda de direitos, mas sim melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores.”
 

Painel de Saúde expõe práticas abusivas de gestão no Itaú e seus impactos na vida dos trabalhadores

No período da tarde, o encontro contou com o Painel Saúde e Condições de Trabalho, conduzido por Mauro Salles, secretário de Saúde da Contraf-CUT. A apresentação trouxe à tona dados preocupantes sobre as práticas de gestão do Itaú-Unibanco, que configuram um verdadeiro “mecanismo adoecedor”, marcado por vigilância excessiva, cobrança abusiva e impactos diretos na saúde mental e física dos bancários.

Entre os principais fatores apontados estão: metas inatingíveis, avaliações injustas, estímulo ao individualismo, reestruturações constantes, jornadas estendidas, assédio moral e monitoramento digital invasivo. Segundo Mauro, o uso de algoritmos e ferramentas de controle cria um ambiente de pressão contínua e mal-estar generalizado.

Um dos exemplos mais emblemáticos é o Programa GERA, que funciona como um sistema permanente de monitoramento e ranking de desempenho. Por meio dele, gestores realizam cobranças em tempo real, inclusive fora do expediente, com supervisores enviando mensagens ou ligações via WhatsApp e plataformas internas. Reuniões diárias expõem os resultados de cada funcionário, intensificando a competição e o constrangimento.

As consequências são reconhecidas por organismos internacionais como a OIT e pelo NIOSH como de alto risco psicossocial: aumento de casos de ansiedade, depressão, crises de pânico e burnout; estresse crônico; insegurança no emprego; isolamento e rivalidade entre colegas; além da sensação de estar sendo vigiado em tempo integral, até durante pausas ou no home office.

Essas práticas, além de violarem princípios básicos da Constituição Federal e da CLT, também ferem normas como a NR-17, a LGPD e convenções internacionais da OIT (nº 155 e nº 190). Mauro lembrou que há precedentes na Justiça que reconhecem o caráter abusivo dessas práticas, como o processo nº 0066500-61.2005.5.02.0044, no qual o Itaú foi condenado por assédio moral organizacional e cobrança vexatória de metas.

Um ponto destacado foi que a própria lógica algorítmica pode servir de prova contra o banco, uma vez que todos os registros digitais — logs, relatórios de produtividade, notificações automáticas e rankings — constituem a materialidade do assédio, tornando o que antes era invisível em evidência documental.

Como encaminhamento, foram apontadas ações sindicais fundamentais, entre elas:

  • Denunciar formalmente ao Ministério Público do Trabalho e à Auditoria Fiscal do Trabalho;
  • Reivindicar auditoria externa sobre os dados captados pelos sistemas digitais do banco;
  • Negociar a readequação do Programa GERA e limites ao uso das plataformas de monitoramento;
  • Realizar campanhas de mobilização, reforçando que “Não somos robôs. Conectar não é se submeter”.

“O que vemos hoje no Itaú é um modelo de gestão que adoece os trabalhadores. Metas abusivas, vigilância constante e algoritmos que controlam cada clique transformam o ambiente de trabalho em um espaço de medo e pressão permanente. Isso não é inovação, é exploração disfarçada de tecnologia. Nosso papel como sindicato é denunciar, negociar limites e garantir que a saúde e a dignidade da categoria sejam respeitadas. Não somos máquinas, somos trabalhadores com direitos e vamos lutar para preservá-los”, finalizou Mauro.

A coordenadora do Grupo de Trabalho (GT) de Saúde do Itaú, Luciana Duarte, fez um apanhado das negociações do último ano e da mesa de saúde dos trabalhadores entre o Comando Nacional dos Bancários e a Fenaban no período.

COE Itaú cobra transição justa diante das novas tecnologias e respeito ao emprego bancário

Antes de encerrar, os participantes também debateram a pauta de reivindicações específicas, que deverá orientar as próximas mesas de negociação e integrar futuros instrumentos coletivos a serem firmados entre as entidades sindicais e o Itaú-Unibanco.

Para a coordenadora da COE Itaú-Unibanco, Maria Izabel Cavalcanti Menezes, a reflexão sobre o papel da tecnologia foi central. “É importante conhecer as novas inovações tecnológicas, mas elas precisam vir para melhorar o serviço, como ferramenta de auxílio, e não para substituir o trabalhador. Esse é o grande nó. Queremos uma transição justa para o modelo de inteligência artificial, que garanta o emprego bancário, respeite o meio ambiente e assegure trabalho decente, permitindo que os trabalhadores se beneficiem dos ganhos de produtividade”, destacou.

Segundo a dirigente, é fundamental construir propostas que fortaleçam a luta nacional contra os ataques do Itaú, como o fechamento de agências, as demissões, as metas abusivas, a sobrecarga de trabalho e o adoecimento da categoria.

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