50 mil mulheres negras marcham contra o racismo e contra a violência em Brasília

Milhares de mulheres negras, quilombolas, indígenas e yalorixás abriram a primeira edição da Marcha das Mulheres Negras, realizada nesta quarta-feira (18), em Brasília. A organização fala em aproximadamente 50 mil presentes em luta contra o racismo, a violência e as más condições de vida enfrentadas por essa população.

“Nos últimos anos, tivemos um grande processo de reformulação, de mudanças, de ampliação de direitos, de acesso a políticas e a bens e serviços. No entanto, quando a gente faz um recorte racial e de gênero, identificamos que as mulheres negras, um quarto da população, estão em condição de vulnerabilidade, de fragilidade, sem garantias”, disse a coordenadora do núcleo impulsor da Marcha, Valdecir Nascimento, coordenadora executiva do Instituto da Mulher Negra da Bahia (Odara)

Dados do último Censo, de 2010, indicam que as mulheres negras são 25,5% da população brasileira (48,6 milhões de pessoas).

Isso não garante, entretanto, que elas tenham mais direitos garantidos. Entre as mulheres, as negras são as maiores vítimas de crimes violentos. De 2003 para 2013, o assassinato de mulheres negras cresceu 54,2%, segundo o Mapa da Violência 2015: Homicídios de Mulheres no Brasil. No mesmo período, o índice de assassinatos de mulheres brancas recuou 9,8%, segundo o estudo feito pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), a pedido da ONU Mulheres.

“A Marcha quer falar de como um país rico como o Brasil não assegura o nosso direito à vida. Queremos um novo pacto civilizatório para o país. O pacto atual é falido e exclui metade da população composta por mulheres e homens negros”, disse Valdecir.

A secretária nacional de Combate ao Racismo da CUT, Maria Julia Nogueira, afirmou que a marcha é a realização de um sonho e de uma luta histórica da central. "A CUT diz que é preciso não aceitar mais o racismo. A democracia só vai se consolidar quando a sociedade não permitir o racismo. Vamos dizer a esse Congresso machista e racista que a discriminação racial não dá mais nesse país".

Para a vice-presidenta da CUT, Carmen Foro, a Marcha das Mulheres Negras escreveu uma página da história no país. "Nós queremos agora que o Brasil pegue o que nós produzimos e acumulamos ao longo dos séculos e transforme em política. Temos que enfrentar de fato o racismo, a violência e que nos reconheça enquanto parte de quem produz a riqueza nesse país”, definiu.

"Hoje as mulheres negras mostram para o mundo e para o Brasil a nossa força e resistência. Dizemos ainda que queremos estar em todos os lugares. É importante marchar pela implementações de políticas públicas para as negras", afirmou Nilma Lino Gomes, Ministra das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos.

Bastante emocionada, a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) afirmou que era um momento histórico porque a marcha traz a marca e o suor de cada movimento, das donas de casa que conseguiram adquirir um diploma universitário.

"Não somos uma qualquer. Estamos conseguindo o nosso espaço e marchando para dizer: não aos projetos que tiram os direitos das mulheres; não à matança de jovens negros; não à violência contra as mulheres. Basta de intolerância! Não queremos retrocesso, mas queremos, sobretudo, defender o Estado Democrático de Direito".

A concentração da 1ª Marcha das Mulheres Negras começou no Ginásio Nilson Nelson, na região central da capital federal. O grupo seguiu caminhada em direção à Praça dos Três Poderes, às 9h.

Chegando em seu destino final, a marcha encontrou com um grupo, que pede o retorno da ditadura militar e o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, ali acampado. Um policial civil de Sergipe jogou bombas contra os manifestantes e disparou quatro tiros para o alto. Detido na frente do espelho d'água, alegou que se sentiu ameaçado.

Junto às bandeiras, estavam a diretora executiva da ONU Mulheres, Phumzile Mlambo-Ngcuka, ex-vice presidenta da África do Sul, e a ex-integrante do grupo Panteras Negras e do Partido Comunista dos Estados Unidos, Angela Davis. Também esteve presente Gloria Jean Watkins, mais conhecida pelo pseudônimo bell hooks, autora, feminista e ativista social norte-americana.

A primeira manifestação que reivindicou os direitos da população negra no Brasil ocorreu no dia 20 de novembro de 1995. A luta já apresentou resultados, com políticas mais inclusivas e maior igualdade. Agora, a Marcha das Mulheres Negras apresentam as novas pautas em busca de mais direitos.

"O Brasil vive um momento de fazer o desenvolvimento das mulheres negras fora da pauta. Nós não admitimos isso. Agora queremos decidir no poder, não vamos delegar a nossa representação a ninguém. Essa é a grande virada", disse Vilma Reis, socióloga, ativista do Movimento de Mulheres Negras, Ouvidora Geral da Defensoria Pública do Estado da Bahia.

Marcha das Mulheres Negras é atacada por golpistas

O grupo de golpistas acampados em frente à Esplanada dos Ministérios com faixas que pedem intervenção militar no Brasil atacou a Marcha das Mulheres Negras. Integrante do acampamento, um manifestante que seria policial civil e cuja identidade ainda não foi revelada, foi preso após dar quatro tiros para o alto quando a marcha passava diante do Congresso Nacional.

Secretária da CUT de Combate ao Racismo, Maria Júlia Nogueira, criticou a reação da polícia militar do DF diante do fato. “Um dos golpistas deu um tiro pra cima e a polícia chegou como se fosse protegê-los, começou a jogar spray de pimenta nas mulheres, que estavam em uma manifestação pacífica. Tanto que durante todo o trajeto não houve qualquer incidente”, apontou.

Para Júlia, a ação não foi diferente do que acontece todos os dias nas periferias das cidades com os negros. “Os trabalhadores são tratados assim nos estados onde há partidos conservadores no comando”, apontou.

A deputada federal Janete Pietá (PT-RJ), que acompanhava o ato, disse que as mulheres também foram atingidas por bombas. “Quando atirou, simultaneamente, começaram a jogar bombas”, relatou.

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