Telecomunicações e bancos estão no topo das queixas aos Procons

O Globo
Daiane Costa
Juliana Garçon
Luciana Casemiro

O resultado do balanço dos cerca de 2,5 milhões de atendimentos feitos nos Procons de todo o Brasil, em 2014, confirma as queixas expressas por boa parte dos consumidores nas conversas entre amigos e nas redes sociais: os serviços de telecomunicações e bancários ainda são a grande fonte de dor de cabeça dos brasileiros. Prova disso é que, juntos, os dois segmentos somam nove das dez empresas mais demandas segundo o Boletim do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), obtido com exclusividade pelo GLOBO, que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) do Ministério da Justiça divulgará nesta segunda-feira (9).

No ranking geral, as dez primeiras são Oi fixo/celular (196.377), Vivo/Telefônica (111.778), Claro/Embratel (110.339), Itaú (81.537), Bradesco (73.552), Sky (67.343), TIM/Intelig (52.374), Casas Bahia/Ponto Frio/Nova PontoCom (50.585), Caixa Econômica (36.298) e Net (34.876). Na lista de assuntos mais demandados, a telefonia fixa ficou em primeiro lugar reflexo do aumento da venda de combos ficando a telefonia celular em segundo, seguida por banco, cartão de crédito e TV por assinatura.

A soma das demandas relativas às telefonias celular e fixa com aquelas feitas sobre bancos e TV por assinatura superam os 760 mil registros. Na avaliação da titular da Senacon, Juliana Pereira, a quantidade de reclamações, embora relevante, não é a questão principal.

“A quantidade de reclamações vai ser sempre grande. São os setores mais utilizados do planeta. As relações de consumo são impessoais e pode haver problemas. O que é preciso analisar é como a empresa se comporta na solução desses problemas. Há companhias que, apesar de ainda constarem do ranking das mais reclamadas, têm feito um bom trabalho, reduzindo o número de queixas e melhorando o índice de solução nos Procons. O que preocupa é quando a empresa mais reclamada é também aquela, no seu setor, com menor índice de resolução”.

Situação é alarmante

Para Ricardo Morishita, diretor de Projetos e Pesquisas do Instituto Brasiliense de Direito Público, no entanto, os dados do relatório são alarmantes. Primeiro, diz, porque a tendência no setor de telecom tem sido de aumento contínuo de demandas. De oito empresas, seis registraram crescimento por, ao menos, dois anos consecutivos. Na Vivo, de 2012 a 2014, o volume cresceu duas vezes e meia. Na Sky e na Net, dobrou. Na Nextel, subiu 46%. Só GVT, cujo número de reclamações triplicou entre 2012 e 2013, e Oi, contra a qual as queixas haviam crescido 38,7% em 2013, tiveram um suave recuo em 2014.

“Se fosse um problema pontual, num ano, seria compreensível. Preocupa porque não há sinal de estabilização, muito menos de melhora. O que foi feito até agora não basta”, avalia Morishita.

Ele reconhece que houve avanços nos últimos dez anos, com a universalização do serviço e a ampliação da base de assinantes. Mas, como se trata de um setor estratégico, cujas ineficiências têm grande impacto, e que é entregue pelo governo mediante compromissos, a persistência no topo do ranking mostra a necessidade de revisar o modelo de concessão.

“O Estado tem ferramentas e mecanismos para defender os direitos do cidadão. E tem de fazê-lo com a regulação ressalta. Sair de casa para fazer queixa em um órgão público exige tempo e disposição. Não é um passeio. Se a pessoa vai se manifestar, é porque a coisa é grave. Todo esse volume de reclamações indica que alguma coisa não deu certo”.

A Anatel reconheceu, em nota, que há avanços a serem obtidos na relação entre prestadores e consumidores de telecomunicações, e que vem perseguindo estes objetivos utilizando medidas como as novas regras implantadas no Regulamento Geral de Direitos do Consumidor, em vigor de forma escalonada desde julho de 2014.

Dos 2,49 milhões de atendimentos feitos nos Procons dos 26 estados, além do Distrito Federal, 62% foram reclamações e denúncias (62%), os outros 38%, consultas ou orientações. O boletim do Sindec também mostra que problemas com cobrança são, disparado, os maiores motivos de reclamação. Foram 844.052, o equivalente a 35,56%. Para Gisela Simona, presidente da Associação Brasileira de Procons (Procons Brasil), esse dado reflete uma situação gravíssima, tendo em vista que a maioria é de cobrança indevida.

“Não tem justificativa. A empresa detém todas as informações sobre o que o consumidor usa e quanto deve ser cobrado. Não pode errar”.
Morishita concorda. “É inadmissível ser cobrado por algo além do que usou. E que os procedimentos para reaver esses valores sejam tão sofridos. Após uma década convivendo com esses problemas, a regulação tem de fixar e gerir regras mais exigentes, dar uma resposta efetiva e severa, com maior competição e novos players, além da aplicação de multas”.

As cobranças indevidas, acredita Gisela, têm relação direta com o segundo problema mais reclamado no ano passado aos Procons, que diz respeito ao descumprimento de oferta. Isso porque, explica, se a oferta não é clara, o resultado pode ser uma queixa de cobrança indevida.

A fim de poder identificar com mais precisão as causas dos problemas, a Senacon trabalha para lançar este ano uma nova versão do Sindec.

“A meta é criar um refinamento que nos permita ver se houve um problema na oferta, por exemplo, que fez o consumidor entender que a cobrança é indevida, ou se há uma prática de má-fé, a inclusão de um serviço não pedido. Quanto mais preciso formos, melhor será a nossa atuação”, ressalta Juliana.

Para a coordenadora de atendimento do Procon-RJ, Soraia Panella, a insatisfação com a prestação de serviço, que no Rio se concentra principalmente no setor de telefonia, também tem reflexo nas queixas por cobrança indevida. “Ninguém quer pagar pelo que não funciona como prometido.”

Quando analisados regionalmente, os dados do Sindec mostram que Sul, Sudeste e Centro-Oeste têm um perfil semelhante de problemas com foco na telefonia, enquanto no Norte e Nordeste o ponto mais sensível são bancos, cartão de crédito e concessionárias de serviços públicos, como água, esgoto e energia. Este pode ser, diz Gisela, um indicativo de que as empresas costumam investir nas regiões onde a população é culturalmente mais ativa na busca pelo cumprimento das leis que protegem o consumidor:

“Problemas relacionados ao sistema financeiro tiveram queda nas regiões Sul e Sudeste, onde se reclama mais. Já no Norte e Nordeste, onde a participação com reclamações não é tão expressiva, eles continuam em destaque.”

A Oi informou ter investido R$ 4 bilhões na expansão e melhoria da qualidade das redes móvel (3G e 4G) e fixa para banda larga e TV paga. A Vivo destacou que seu índice de solução das demandas dos Procons está em torno de 82%. Tanto Claro como Embratel ressaltaram o fato de terem melhorado uma posição no ranking em relação a 2013.

A Sky informou investir na melhoria de processos, no treinamento das equipes e na adoção de medidas para reduzir reclamações. A TIM ressaltou que continua sendo a empresa menos reclamada de seu setor, com índice de solução acima de 80% nas demandas preliminares. A Net informou investir em treinamento e ressaltou ser a TV por assinatura com o melhor índice de atendimento, segundo a Anatel.

No setor bancário, o Itaú chamou atenção para o fato de ser a segunda instituição financeira que mais resolveu queixas, segundo o Sindec, com índice de 83,2%. O Bradesco afirmou ter revisado processos e desenvolvido programas de formação e aperfeiçoamento de funcionários. A Caixa ressaltou dar prioridade à redução de queixas e ao avanço nas soluções. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) ressaltou que o cadastro do Sindec registrou queda de 6% nas demandas dos bancos comerciais em relação a 2013.

Única rede varejista na lista das dez com mais queixas, a Via Varejo e a Cnova, que administram Casas Bahia/Ponto Frio/Nova PontoCom, informaram investir em treinamentos e ações para melhor atender os clientes.

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