Clientes dos bancos ignoram peso das tarifas bancárias no Brasil

Heron Vidal
Correio do Povo

Despercebido por grande parte dos correntistas, o custo das tarifas cobrado pelos bancos por serviços efetuados em terminais eletrônicos de autoatendimento como, por exemplo, consulta ao saldo, extrato e transferência, entre outras operações, é também um mistério.

Desde 2008, os bancos estão obrigados a deixar clara a despesa sobre todos os serviços. Devem, também, oferecer pacotes nos quais se incluam serviços essenciais gratuitos. Na prática, isso nem sempre acontece. A maioria dos clientes tem pacotes de serviços inadequados ao seu interesse, por terem sido definidos pelo banco, registra o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Pela resolução 3.919/2010, os bancos são obrigados até 28 de fevereiro de cada ano a disponibilizar gratuitamente ao correntista o extrato anual de cobrança de tarifas. Mas, conforme a economista do Idec Ione Amorim, uma enquete da instituição mostra que 70% dos usuários desconhecem esse direito. “E, objetivamente, os bancos não colocam essa informação em evidência, a escondem, sem descumprir a obrigação”, observa.

Em outra pesquisa, o Idec constatou reajuste dos serviços bancários superior a 100% nos últimos cinco anos. Para o presidente da S.O.S. Consumidor, Lisandro Gularte Moraes, é muito fácil cobrar dos correntistas. Uma das “manobras” para extrair dinheiro, imperceptível à maioria, é o aumento do limite de endividamento no cheque especial, para depois taxá-lo pelo novo benefício, não solicitado.

O problema, diz, é que o Banco Central (BC) “tabelou o valor dos serviços lá em cima, na estratosfera. Apenas por curiosidade: o banco pode cobrar uma tarifa de até R$ 300 para a exclusão do cadastro de emitentes de cheque sem fundos”.

Na avaliação do presidente do Movimento das Donas de Casa e Consumidores do RS, Cláudio Pires Ferreira, a sensação é de impotência do cidadão diante do poder dos bancos. “Nem ação judicial cabe no caso das tarifas, pois o BC, que deveria ser o xerife, é o maior aliado do setor. Liberou geral, juros e tarifas, em nome de uma concorrência inexistente, nem nas tarifas, nem nos juros”, protesta.

Ione Amorim recomenda aos clientes o exercício da cidadania: exigir dos bancos a presença, ao lado do caixa eletrônico, da tabela do custos. Outra atitude é buscar na página do BC na Internet www.bcb.gov.br os quatro pacotes-padrão sugeridos e compará-los com o do seu banco.

“Bolo fabuloso” de 160 milhões de contas

Por mês, as pessoas físicas com conta corrente em bancos pagam, em média, de R$ 20 a R$ 30 a título de serviços. No Brasil, informa a economista do Idec Ione Amorim há cerca de 160 milhões de contas bancárias. “É uma receita fabulosa transferida mensalmente ao setor financeiro”, diz.

Os correntistas podem escolher “pacotes” de tarifas cobrados por serviços. Todas as instituições oferecem menus combinando serviços e valores. Cada caso é um caso, mas, diz o presidente do Movimento das Donas de Casa do RS, Cláudio Ferreira, a lógica é sempre a mesma: quanto mais dinheiro aplicado no banco tem o cliente, menos tarifas pagará é candidato à isenção e convidado para negociar esse custo.

A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) comunica que uma ferramenta de consulta de tarifas e pacotes de qualquer banco, além da página eletrônica do Banco Central, é o site www.febraban-star.org.br.

Os correntistas, diz a Febraban, estão mais interessados no tema. Nos últimos anos os acessos ao Star cresceram 13,5%: passaram de 3,7 milhões em 2011 para 4,2 milhões em 2013. Um consolo vem da informação do professor de economia da Unisinos André Azevedo.

O Brasil não é campeão de cobrança das tarifas. Num ranking de 15 grandes países, pesquisados pela multinacional Accenture, em 2011, o país era o 13º, seguido pelo México e, Índia, o último.

Clientes denunciam que é difícil decifrar valores

As pessoas confirmam: é um mistério, não há como saber o valor transferido aos bancos em pagamento dos serviços. O setor financeiro não informa com clareza aos clientes. Talvez essa seja a razão da ausência de reclamações em órgãos de defesa do consumidor.

No Procon de Porto Alegre, segundo a diretora executiva, Flávia do Canto Pereira, o segmento recordista em reclamações é o da telefonia celular acompanhado de perto pelo de TVs por assinatura. Os bancos estão em terceiro lugar, com um saldo de 931 reclamações desde a criação do órgão, em 2008.

Técnico em enfermagem, 33 anos, Álvaro Escarparo, não consegue ter o domínio das despesas. “Não tenho controle nenhum sobre as taxas bancárias, mas retiro na média três extratos por mês.”

Na mesma situação, o economista e administrador de empresas, Assis Figueiró, 60 anos, é um crítico dos bancos. “Somos roubados, mas não temos alternativa, precisamos do serviço. O brasileiro não sabe o quanto paga aos bancos, cuja alíquota de imposto pago, apesar de lucrarem bilhões, é a mesma de uma pessoa física.”

Com 56 anos, a dona de casa Jurema Moreira, a exemplo do técnico em enfermagem e do economista, sabe que paga aos bancos, mas ignora o significado financeiro desse custo. “Não tenho o controle dos valores, sei que tenho, por exemplo, o IOF descontado todo o mês, mas não sei exatamente o quanto é isso. Esse dinheiro que sai de pouquinho em pouquinho, todos os meses, faz falta para mim.”

Os serviços gratuitos

– Resolução 3.919 do Conselho Monetário Nacional e em vigor desde 25 de novembro de 2010 define serviços que não podem ser cobrados das pessoas físicas relativos à conta corrente de depósito à vista:

Cartão com função débito

– 2ª via do cartão de débito, exceto nos casos de perda, roubo, furto, danificação e outros motivos

– Até quatro saques, por mês, em guichê de caixa, inclusive por meio de cheque ou de cheque avulso, ou em terminal de autoatendimento

– Até duas transferências de recursos entre contas na própria instituição, por mês, em guichê de caixa, em terminal de autoatendimento e/ou pela Internet.

– Até dois extratos, por mês, contendo movimentação dos últimos 30 dias via guichê de caixa e/ou terminal de autoatendimento

– Consultas mediante Internet &Fornecimento até 28 de fevereiro de cada ano de extrato com os valores cobrados no ano anterior

Compensação de cheques

– Até dez folhas/mês
– Prestação de qualquer serviço por meios eletrônicos

Serviços da conta de poupança

– Cartão de função movimentação
– 2ª via do cartão
– Até dois saques/mês, em guichê de caixa ou de autoatendimento
– Até duas transferências/mês para conta de depósitos da mesma titularidade
– Até dois extratos/mês com a movimentação dos últimos 30 dias
– Consultas via Internet
– Fornecimento até 28 de fevereiro de cada ano de extrato discriminando cobranças do ano anterior

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