Carlos Cordeiro: o desafio de seguir em frente

Recém-eleito para a presidência da Contraf, Carlos Cordeiro tem 12 anos de atuação sindical, a maior parte na entidade nacional, desde os tempos de CNB. Bancário do Itaú há 24 anos, viveu a luta por importantes conquistas da categoria e mantém o olhar crítico voltado para o futuro. Ciente do desafio de rever o modelo de PLR e de buscar o resgate do papel de bancos públicos perdido pelo BB e pela CEF, Carlão, não esmorece diante das dificuldades. Durante o XI Congresso Ordinário Interestadual do RJ e ES, realizado em Petrópolis em 28 e 29 de abril, o dirigente conversou com o jornal UNIDADE. Publicação da Federação dos Bancários do Rio de Janeiro e Espírito Santo.

Como foi a sua trajetória na Contraf até chegar à presidência?

Antes de ser secretário-geral por duas vezes, fui tesoureiro por duas vezes. Tive o privilégio de estar numa direção que teve, primeiro Sérgio Rosa, depois Fernanda Carísio como presidentes. Eu, menino, vindo da Fetec São Paulo, fui substituir o Pinheiro (José Pinheiro de Miranda), que hoje trabalha com o próprio Sérgio Rosa (presidente da Previ). Entrei já como tesoureiro, na época, na CNB. Então, para mim, trabalhar com estes companheiros, tanto o Pinheiro com quem eu já havia trabalhado na Fetec, como depois na gestão com o Sérgio Rosa à frente, depois a Fernanda e, por último, o Vagner (Freitas), foi uma escola fantástica. Ao longo destes mandatos, tanto na CNB quanto agora na Contraf, pude perceber um pouco da história do movimento sindical, o compromisso destes companheiros, e pensar um pouco mais nesta questão do secretário-geral. É bem diferente ser secretário-geral da Contraf, da federação e do sindicato. Eu nunca fui secretário-geral destas entidades. Na Contraf, como o diálogo é com os sindicatos – no sindicato, o diálogo é com o bancário – há uma dificuldade muito grande, uma das minhas frustrações é não ter conseguido fazer um seminário com os secretários-gerais. Acabei não conseguindo fazer. Quando tesoureiro, fiz dois seminários com os tesoureiros – até para trocar experiências, conhecer como funcionam os sindicatos e as federações. Mas, na Contraf, fizemos um esforço de tentar envolver as secretarias, os diretores.

O que é, na sua concepção, ser dirigente sindical?

Sempre pensei que, para ser dirigente, independente do cargo, você não está nem acima nem abaixo. Quando eu entrei, usava-se muito a expressão “capa preta” (dirigentes que seriam o núcleo principal, com as melhores idéias, que estão à frente do processo). Mas eu pensava que, por mais que estivesse numa regional da Fetec, sempre pensei que, apesar da minha inexperiência, a minha responsabilidade era a mesma, e nunca abri mão disso. Sou dirigente, vim para o MS com aquele sonho de transformar a sociedade, transformar a realidade do espaço do trabalho. A gente sai da base e vem para cá, neste momento você conhece bastante os problemas do seu local de trabalho, então vem cheio de gás. Sempre fiz questão de respeitar a história de cada um no movimento sindical, nunca abri mão de me enxergar como dirigente sindical, desde o dia que eu entrei. No lançamento da revista dos bancários de Campinas, há uns seis ou oito anos, houve um debate sobre assédio moral. Estávamos discutindo metas, pressão, e uma bancária levantou na frente de todos os dirigentes sindicais e do RH do banco e disse duas coisas que me chamaram muito a atenção e me balizam neste meu papel de dirigente: ela disse que quando um cliente entrava na agência – ela era caixa – ela falava com os ‘amigos dela, nos guichês ao lado “lá vem o frango, vamos arrancar todas as penas que este frango tem e vamos socar produtos nele. A gente tem que vender para ser remunerado por isso”. E a outra coisa que ela falou foi o seguinte: “eu tenho dúvida se a minha ética é a mesma de quando eu entrei no banco”. Hoje, todo dia eu acordo de manhã e penso que ideia nova vou ter hoje, o que eu vou propor, para que a realidade deste bancário que eu represento seja diferente disso e que eu não perca para o banqueiro como nós estamos perdendo hoje ideologicamente. O banco está lá todo dia, motivando, cobrando, mandando vender. Eu acho que a gente está um pouco distante deste bancário. Um dos grandes desafios que a gente tem hoje é dialogar mais de perto com este trabalhador. Você pega o BB: hoje, 60% dos funcionários têm até cinco anos de banco. Neste momento importante, que é um desafio fundamental que temos hoje, o que estes bancários conhecem sobre banco público? Outra coisa: eles entram nos sites dos bancos para procurar emprego e veem lá os benéficos, cesta alimentação, cesta refeição, PLR, e a gente sabe que isso não é benefício. Isso é história do movimento sindical. Em 1985 fizemos uma greve fantástica, nacional, o encontro em Campinas e, a partir dali, começamos a ter um movimento nacional mais forte.

O que aconteceu naquele momento?

Antes de 1985 não se tinha nada dessas coisas. Por exemplo, o tíquete-refeição. Quando eu entrei no banco, em 85, não tinha tíquete-refeição nem alimentação. Tinha um lanche que o banco oferecia, o Itaú tinha até padaria dentro do banco. Vinha um café com leite, um pão com manteiga de manhã. Depois o Movimento Sindical começou a cobrar que os bancários deveriam ter um tíquete. Mas não o conquistamos, conseguimos a sacolinha, a famosa, ou quentinha, como diziam em algumas cidades. E vinha ali uma banana, um iogurte e, normalmente, um pão com salsicha. Nós continuamos reclamando. Era um absurdo. Já naquela época, as grandes empresas não ofereciam um lanche daquela qualidade. E aí nós conquistamos, depois de muita briga, de muita mobilização, o tíquete. Só que o tíquete era de maior valor para quem trabalhava oito horas e um de menor valor para quem tinha jornada de seis horas. E eu lembro que a campanha que fizemos para unificar e para ampliar para o valor de oito horas era o estômago de quem trabalhava seis horas era o mesmo de quem trabalhava oito. Foi uma briga danada e nós conquistamos o tíquete neste valor atual para todos os trabalhadores e trabalhadoras.

Como foi essa luta?

Eu lembro que, quando foi trocar da sacolinha para o tíquete, não foi com greve que nós fizemos. Nós pedimos a todos os bancários que trabalhavam na Rua Boavista, que é um grande centro financeiro de São Paulo, que naquele dia não comessem seu lanche, principalmente os do Itaú. Os funcionários não comeram e entregaram para o sindicato. Nós fomos na calçada da Boavista, mais ou menos às onze horas da manhã, e colocamos uma ao lado da outra, milhares de sacolinhas na calçada. E foi a correria da população, de mendigos e um monte de gente para pegar as sacolinhas. Nós criamos uma situação vexatória para o banco e, a partir de então, foi substituída a sacolinha pelos tíquetes. A própria PLR, embora tenha sido regulamentada em lei, muitas empresas não têm. Temos na terça-feira (05) um debate com a Fenaban para que a gente possa tentar mudar essa regra que está muito complicada. Mas é uma conquista nossa. Neste valor de hoje, com 2.2 salários, mais uma PLR adicional que, para alguns bancários dá mais um salário. Você ter, para boa parte dos bancários, uma PLR que chegue a três salários, não é desprezível. E ainda tem outras conquistas, como a própria PCR do Itaú que, para alguns, dá também um salário. Um caixa, por exemplo, chega a receber quatro salários. Mas precisa rever regras, os bancos estão burlando seus balanços – o Itaú publicou este ano sete balanços. A lei permite que eles se utilizem dessas artimanhas. No Santander há uma dúvida sobre o balanço, sumiram mais de R$ 2 bilhões no balanço nos últimos dois meses.

Essa memória vai se perdendo…

São histórias que o bancário desconhece e a Contraf, junto com os sindicatos e as federações, precisa escrever. Nós vamos fazer uma revista, entregar para cada bancário, contando cada uma destas nossas conquistas, como foi, fruto de muita luta. Precisamos discutir com esses novos bancários qual o papel de um banco público. Eu estive na ultima semana nos congressos do BB e da CEF e fui fazer uma visita aos novos vice-presidentes o BB e estive com o novo presidente, o Dida, do BB. E, justamente na hora em que estávamos falando sobre o papel de banco público que ele entrou na sala. E a gente falava que os funcionários desconhecem a própria história do banco, não sabemo o papel de banco público. Ele disse que um dos desafios que tem como presidente do banco é de resgatar no funcionalismo esta característica de banco público, comprometendo os trabalhadores e o banco nesta nova fase do BB. Então, eu acho que a gente tem muitas histórias que não conta, não escreve, não registra e, quando faz, é de maneira desorganizada. Os meios que a gente tem hoje facilitam contar esta história.

Qual seu melhor e seu pior momento na Contraf?

Meu pior foi quando eu entrei, pela minha inexperiência. Não na Contraf, mas ainda na CNB. Fiquei muito assustado. “Nossa, ter que substituir o Pinheiro na tesouraria!” Ele tinha sido o presidente da Fetec-SP, tesoureiro da CNB e era o dirigente da CNB que mais falava em público, mais dialogava. E eu, “caramba, sou um menino, estou chegando agora, não tenho essa experiência”. Tinha uns 27, 28 anos. Em relação a esses companheiros eu era muito novo. E ficava preocupado, tinha que substituir à altura e eu não tinha essa experiência toda. Foi um momento muito difícil, de medo, de preocupação. E acho que o melhor momento foi a ousadia, junto com companheiros como o Vagner, de construir a Contraf. A CNB tinha um monte de processos, de contestações da própria Contec. Nós falamos que era hora de consolidar um processo, uma história nossa. Das alternativas colocadas, vimos que a melhor era de construir a Contraf de fato e de direito. Nós tínhamos a CNB de fato, mas não tínhamos de direito. Nós pensamos muito, corremos muitos riscos, mas tivemos, inclusive, a compreensão de muitos companheiros, não só da Articulação, mas das outras forças, num processo de confiança, da gente poder consolidar a Contraf da maneira que ela é hoje. Então, o melhor momento foi quando a gente saiu vitorioso deste processo de ter, hoje, a Contraf reconhecida. Ela hoje negocia – já negociava, mas hoje assina, responde, de fato, pela categoria. Esse foi o melhor momento, junto com a consolidação do Contrato Coletivo de Trabalho para todo mundo. O movimento sindical não comemorou corretamente.

Isso foi em 1992?

Não. Em 1992 foi a Convenção Coletiva, mas não era para todo mundo, era só para os bancos privados, só a Fenaban. Tinha as negociações de BB e Caixa. Depois, o governo Fernando Henrique, primeiro não negociava com os sindicatos, o governo não reconhecia os sindicatos como legítimos representantes, negociava com a Contec, que tinha menos de 10% da categoria, e impunha aquele resultado da Contec para todo mundo. Teve reajuste zero, teve abono. Neste período, o grande debate que fazíamos era de que deveríamos ser respeitados, deveríamos estar na mesa e que deveria ter uma convenção para todo mundo. Quando o Lula entrou, fortalecemos esse pedido, porque, na gestão do governo Lula, ficamos ainda dois anos sem cumprir a Fenaban, e essa vira a grande bandeira nossa. E nós conquistamos, durante o governo Lula, a convenção coletiva para todo mundo. Foi em 2006. Essa convenção coletiva para todo mundo, quando a gente compara com outras categorias, ou até na Central Única dos Trabalhadores, pega, por exemplo, a indústria têxtil, a metalúrgica, que saíram lá da região do ABC e muitas foram se instalar no interior de Minas Gerais, para pagar ao trabalhador, fazendo a mesma função, a metade do que ele recebia, por exemplo, na região do ABC. E aí, você vê que um caixa bancário, o salário no interior do Rio Grande do Sul é o mesmo do interior do Piauí. E eu acho que esta é uma das grandes conquistas, para mim é a maior conquista da categoria bancária em sua história ter uma convenção coletiva de trabalho para todos os bancários e bancárias. Depois que unificamos, fizemos uma única mesa do nosso lado, de bancos públicos e privados, e a Fenaban também, numa única mesa, nós fortalecemos a nossa luta. Quando você olha um gráfico se vê isso, você tinha uma perda salarial, em termos reais, muito grande. A partir do momento que você junta bancos públicos e privados, estanca essa queda e começa, mesmo que timidamente, a elevar o ganho real dos trabalhadores. Então, hoje, nos já estamos há alguns anos tendo um ganho real, embora pequeno, mas faz uma diferença muito grande ao longo do tempo. Se não tivéssemos todas essas perdas para trás, teríamos hoje um salário muito mais elevado. Então, essa mudança, a partir de uma estratégia nossa, mostra que foi bastante acertada. Hoje temos aumento real de salários e a categoria unificada. Acho que o que a gente precisa fazer agora é incluir os outros 600 mil trabalhadores e trabalhadoras que são bancários, trabalham para o sistema financeiro e estão excluídos disso. O pessoal das financeiras, das terceirizadas, das lotéricas, todos eles prestando serviços bancários e recebendo, muitas vezes, menos da metade que um bancário receberia. Acho que este é o grande desafio da Contraf hoje.

Hoje, só três bancos grandes têm acordo aditivo – Caixa, BB e o Santander, agora junto com o Real. Isso é algo que a Contraf pretende construir nos outros bancos?

Por trás dessa sua pergunta dos acordos aditivos, tem algo que para nós é essencial. Temos uma negociação geral, para toda a categoria, que fazemos durante a campanha salarial, em função da nossa data-base. Achamos que é importante que se unifique toda a categoria numa mesma direção, no que é comum a todos os trabalhadores naquele momento. Foi assim que conseguimos ampliar a PLR que temos hoje e foi assim que conseguimos os aumentos reais. Mas há também as especificidades de cada um. E nós fazemos isso nas negociações permanentes durante todo o ano. Eu sou favorável, e acredito que toda a direção seja, que você tenha isso registrado em acordos específicos ou em aditivos à convenção coletiva. Achamos extremamente importante que se coloque no papel todos aqueles avanços, que seja um complemento à convenção coletiva. Nós buscamos isso em vários bancos. Por exemplo, no Itaú não temos acordo aditivo, mas temos uma eleição de conselheiros da previdência complementar, que você só tinha em banco estatal, temos um aditivo que é da PCR. Não é um aditivo à convenção coletiva geral, mas é específico sobre um tema, a Participação Complementar nos Resultados, que pagou, por exemplo, no ano passado, R$ 1.800 para todos os trabalhadores, independente de ter PLR, PR, salário. Isso é fruto destas negociações permanentes. O movimento sindical precisa negociar mais com os banqueiros e mobilizar mais os bancários durante todo o ano, e não apenas durante a campanha salarial. Na campanha salarial se discute as questões gerais da categoria. Por isso eu sou favorável a realizar os encontros nacionais dos bancos e acho que tem que fazer logo após a assinatura da convenção coletiva, porque já se consolidou o geral e podemos planejar a atuação até a data-base de novo, em 1º de setembro, para ampliar as conquistas especificas daquele banco.

As questões sociais entram muito nas negociações permanentes.

Não só nas negociações permanentes com os bancos, mas também com a Fenaban, porque normalmente não se consegue discutir tudo isso com a própria Fenaban. Mas hoje nós temos um problema sério quanto à saúde do trabalhador e precisamos colocar isso como prioridade. A gente não pode ter uma campanha meramente economicista, discutir só índice e PLR. Há muitos trabalhadores usando remédios de tarja preta, tem muita pressão dentro dos bancos. No BB as condições de trabalho estão muito complicadas, é muita pressão. Sabemos que já há pesquisas dentro dos bancos para saber a quantidade de bancários e bancárias que estão utilizando estes remédios de tarja preta. A questão da saúde dos bancários realmente vai se destacar, mesmo que o peso maior ainda seja nas questões econômicas. Temos todo um debate a fazer.

A Contraf pretende estabelecer parcerias e convênios com outras entidades, por exemplo, ONGs, para tratar de questões relativas aos bancos e aos bancários?

Bem, há ONGs e ONGs. A Contraf sempre pretendeu manter relações institucionais com algumas organizações que tenham afinidade com o movimento sindical dos bancários. Com o Idec, por exemplo. A CNB, na época, fez uma cartilha, chamada “Os bancos e você”, falando dos direitos dos consumidores bancários. E nós já temos uma cartilha pronta com uma versão atualizada que íamos fazer no final do ano passado, só que houve o debate do Guido Mantega com os bancos sobre novas regras para os clientes, então nós seguramos, para não soltarmos uma cartilha que estaria vencida. Depois veio o final do ano, em seguida o Congresso da Contraf, e isso ficou adiado. Inclusive, o Idec esteve presente no nosso congresso. Essa cartilha está pronta, nós já a oferecemos aos sindicatos e federações – da outra vez foi feito assim, em parceria com as federações para que a gente possa reproduzir milhares de cartilhas, inclusive com os endereços dos sindicatos e federações e dos institutos de defesa do consumidor na contracapa destes cadernos. Este material está pronto e, exceto o Sindicato dos Bancários de Brasília, nenhuma outra entidade solicitou.
Esses dias o Ipea lançou um baita estudo sobre bancos, sobre spread bancário, um estudo fantástico. Nós até divulgamos. O Ipea iria ao congresso da Contraf – não o Márcio Porchman, mas outro diretor – iria fazer o debate junto com o Sérgio Rosa e o Belluzzo sobre este estudo. Mas na hora ele ligou e informou que não poderia ir. Eu não acho que seja este o tipo de parceria, ele ir fazer uma palestra no congresso. Eu acho que a Contraf precisa ir até o Ipea, discutir como são estes estudos, como a gente pode fazer. Temos 110 sindicatos, nove federações. De que maneira planejada e organizada a gente pode fazer a parceria, por exemplo, com o Ipea? Defendo que a Contraf tenha parcerias. Cheguei a ir ao Núcleo de Violência da USP para discutir com eles a questão da segurança bancária. Eu cresci no movimento sindical e me informaram – e eu concordo com esta visão – que nós fazemos parte da classe trabalhadora. Não posso olhar só para o bancário. Eu tenho que olhar de maneira corporativa para os bancários, que nós representamos, mas dentro de uma sociedade, de um contexto muito maior do que simplesmente de bancários. Por exemplo, no Congresso da Contraf foi lá o Dieese para falar da Faculdade do Dieese, com toda a característica da visão nossa de trabalhador, um projeto excelente que não é só para bancário, é para todo mundo. Nessa questão da segurança bancária, nós fazemos parte da CCasp, que é a Comissão Consultiva para Assuntos de Segurança Privada, onde a gente não discute somente a questão da segurança para os bancos, mas para outras empresas, outras categorias. Nós somos favoráveis a que os sindicatos possam ir para dentro dos conselhos de segurança dos municípios. O dirigente sindical bancário hoje tem toda a estrutura do sindicato, a própria liberação, a facilidade de ter um contrato coletivo nacional, e eu acho que os nossos sindicatos hoje têm todas as condições de ir para dentro da sociedade, de ocupar este espaço. Nós estamos aqui, em Petrópolis, por exemplo. Veja que trabalho fantástico este sindicato tem, há décadas, e hoje elegeu o prefeito da cidade. E não elegeu à toa, foi por conta de uma visão, que foi construída lá atrás, que foi planejada, pensada, o sindicato se preocupou em criar quadros. E hoje tem o prefeito da cidade, já teve o vice-prefeito. Você tem o exemplo do Sindicato de São Paulo, que você teve ministro, como o Gushiken, o Ricardo (Berzoini) duas vezes, o Sérgio Rosa como presidente da Previ, o Wagner Pinheiro é presidente da Petros. Você tem todo um planejamento que é feito. De Petrópolis, temos também o Marcio, que está lá na Previ, que é um dos maiores quadros bancários que nós temos no país.

E qual o caminho para se chegar a isso?

Acho que hoje, talvez, falte aos nossos sindicatos fazer um planejamento mais estratégico, pensar um pouco mais isso, na nossa campanha salarial, na nossa campanha permanente, na nossa ocupação de espaços junto à sociedade. Em cursos que eu fiz, divide-se o grupo em dois e dá-se um quebra-cabeça para cada um. Ganha o grupo que montar o quebra-cabeça mais rápido; os quebra-cabeças são idênticos. E, normalmente, monta o quebra-cabeça mais rápido aquele grupo que teve a etapa de planejar como seria feito. Quando você planeja, é uma diferença absurda. Um monta em 5 minutos e o outro monta em mais de uma hora. Se você não tem planejamento, às vezes tem muita boa-vontade, mas bate cabeça. Então, acho que nós planejamos de maneira muito ruim as nossas ações. Muitas vezes não estamos preparados para situações adversas. Você faz um planejamento e, de repente, aparece uma pedra no meio do caminho. Como faz? Explodir a pedra, pular, passar pelo lado, o que vai fazer? Você precisa contar também com a imprevisibilidade, o que fazer num momento como esse?
Vejo muito isso na nossa campanha salarial. Na hora que a gente fala, o pessoal quer ouvir muito assim: “Como vai ser a campanha?” “Quais são os principais temas?” “Você acha que nós vamos conseguir?” Jogam muito a responsabilidade em quem está à frente do processo. Só que o processo ocorre aqui. O bancário está aqui. E é aquilo que eu falei no começo: tanto eu, que, hoje, sou presidente da Contraf, quanto um bancário que não é liberado e entrou para o sindicato agora, temos a mesma responsabilidade. Ela é diferenciada, mas a responsabilidade é a mesma, somos todos dirigentes sindicais. Então, para este bancário que não é liberado, quais são os principais temas? Para onde ele acha que nós devemos caminhar? Qual o debate que o sindicato está fazendo? Qual o debate que o sindicato está levando para a federação? Qual o debate que a federação está levando para a Contraf? Qual o debate que a Contraf está levando para a negociação? E é duro planejar. Se você planejar, vai saber quem é o seu inimigo, em que campo ele está, qual é seu exército, sua característica, o que você quer conquistar, onde você quer ir, qual a estratégia que você vai utilizar para isso. Acho que nós planejamos pouco. E isso serve para tudo, campanha salarial, campanha permanente, parcerias, eleições.
E olha que com esse nosso pouco planejamento nós chegamos muito longe. Temos convenção coletiva de trabalho, aumento real, PLR, tem ministros que foram bancários, tem prefeitos que são bancários. Imagina se a gente conseguir organizar um pouquinho mais, o que a gente conseguir se organizar um pouquinho mais, o quanto a gente não vai conquistar?

Um desafio para o movimento sindical é a adesão das empresas à licença-maternidade ampliada. Como a Contraf pretende tratar isso nas negociações com a Fenaban e como pretende trabalhar o afastamento maior das bancárias junto aos colegas, no ambiente de trabalho?

Essa pergunta me lembra de quando estivemos na OIT, num debate sobre a crise internacional. Estavam lá os bancos, inclusive a Fenaban, os governos e os dirigentes sindicais, representando os trabalhadores. Uma frase que nós tivemos a oportunidade de usar lá e que acho que reflete muito a sua pergunta é o seguinte: nossa diferença para os bancos, os capitalistas, é que nós colocamos as pessoas em primeiro lugar. O bebê e a mãe têm que estar em primeiro lugar. Não é a jornada, ou a produção, ou as metas dela no banco. E não é o que os bancos olham. Aqui está uma diferença muito grande. Nós valorizamos as pessoas e queremos que as pessoas estejam em primeiro lugar. Os bancos olham o lucro em primeiro lugar e veem a licença maternidade como um aumento de custo, dois meses a mais que as mulheres estarão ausentes e que poderiam estar produzindo mais. Acho que este é um debate que a gente tem que refazer com a sociedade. Porque, não só nos bancos, mas na própria sociedade ainda pode haver resistência a este tipo de ação. Temos um banco importante que já topou, que é o Banco do Brasil, o que facilita as nossas ações. Acho que deveríamos fazer mais este enfrentamento do individualismo, você tem que trabalhar muito, vender produtos, cumprir metas, aumentar sua renda. É sempre você, você, você. É um pouco o debate que fizemos no começo, o debate ideológico que os bancos vão fazendo. “Você é importante, você é importante.” É um contraponto que os sindicatos têm que fazer. É um exemplo claro de como nós nos sindicatos, nas nossas organizações, temos que abrir mais as portas e janelas das entidades, trazer mais o bancário para o nosso espaço para que a gente comece a discutir valores. E isso é um valor claro, o individual e o coletivo. São as pessoas e o custo para o banco. E os bancos estão todos os dias com os bancários. Eu já vi bancário na rua, da Taií – que, aliás, está sendo fechada – com terapia de grupo “vamos vender, vamos vender” e todo mundo gritando junto. Você não vê nenhuma atividade dessa mais voltada para a solidariedade. São palavras que estão saindo de moda: coletivo, solidariedade. É sempre individualismo. Esaa questão da ampliação da licença-maternidade é, para nós, extremamente importante e acho que vamos conseguir ampliar para outros bancos. E os nossos sindicatos vão fazer isso também. Esse é um debate importante, nossos sindicatos também precisam dar licença-maternidade de seis meses, já tem muitos sindicatos nossos fazendo isso. Eu acho que este é um debate que vai humanizar – não só esse, mas também outros debates que temos na categoria. É a oportunidade que a gente tem de fazer com que o bancário ouça um pouco mais esse clamor que hoje é dos sindicatos e também de boa parte da sociedade. Acho que vamos conseguir caminhar bastante neste tema.

As greves ainda são um instrumento de pressão forte?

Entrei no banco em 85, vou fazer 24 anos. Entrei no dia 09/09/85. E no dia 10 ou 11 – foi dois dias depois – minha chefe falou: “desce, desce.” Eu trabalhava no departamento jurídico, no terceiro andar do prédio Conde de Prates, lá em São Paulo. “Desce, desce, que está em greve e o sindicato está subindo aqui, você tem que descer”. Com dois dias de banco. Eu desci e na hora que eu saí ali na Praça do Patriarca – onde é, hoje, a Contraf – tinha cavalaria, bomba de gás lacrimogênio, uma confusão muito grande. Eu entrei nessa época, entrei fazendo greve. O sindicato estava lá organizando, mobilizando. Esses últimos anos do governo Lula, praticamente em todos os anos nós fizemos greve, os aumentos reais que temos hoje são por conta das greves. A conquista da convenção coletiva é por conta da mobilização e das greves que nós fizemos. Embora a gente tenha ajudado a eleger o governo Lula, nós nunca abrimos mão de ser sindicalistas. Como diz o companheiro Vaccari, “governo é para governar e sindicato é para sindicatear”. Acho que nós fizemos e continuamos fazendo isso.

Você se sente preparado para enfrentar o que vem pela frente?

Já começamos a olhar, 2010 está aí. Nós já estamos com a convenção coletiva consolidada, esperamos que continue um governo defendendo os trabalhadores, com a visão de projeto de sociedade que nós temos. Mas se isso também não ocorrer, estamos preparados para enfrentar. Foi a opção que nós fizemos, de uma campanha unificada, para estarmos preparados para o que der e vier. Com certeza, vamos brigar muito para que tenhamos um governo de acordo com o nosso projeto, que é esse de não privatizar BB, não privatizar Caixa, valorizar crédito, baixar os spreads. Acho que nós nunca tivemos na história, nunca vi, um Presidente da República demitir publicamente um presidente de banco. Ele deu a ordem: os juros têm que ser mais baixos. Acho que este é um momento importante que os sindicatos precisam observar. A bola está pingando na nossa área, vamos discutir o papel dos bancos, um novo papel de banco público. Novo papel do sistema financeiro. Todo o debate de banco público era feito através dos bancos estaduais, que estavam sendo privatizados, BB e Caixa. O dinheiro destes bancos deveria servir para o desenvolvimento – construção de estradas, hospitais, fomentar o desenvolvimento através dos bancos públicos. Acho que isso é verdade, mas, como banco é concessão pública, eu sou funcionário do Itaú, outros são do Bradesco. Por que o salário de quem está no BB tem que servir para o desenvolvimento e o salário de quem está no Itaú e no Bradesco, que é depositado nestes bancos, tem que servir de lucro para o banqueiro? Então, o papel de banco público, esse papel de desenvolvimento, tem que ser o papel de todos os bancos, sejam eles privados ou públicos. Acho apenas que os bancos públicos precisam estar à frente desse processo, para levar os demais bancos. O papel de crédito tem que ser de todos os bancos, para desenvolver projetos de emprego, renda, inclusão social. Acho que este é o principal debate que os sindicatos têm que fazer. Eu defendo, inclusive, que a gente faça cartilhas e que saia de dentro dos sindicatos. Vamos conversar com as ONGs, com as igrejas, com as faculdades, as universidades e vamos debater um bom sistema financeiro. Porque não interessa para toda a sociedade esse sistema financeiro que está aqui. Você tem tarifas que são duas vezes a folha de pessoal, tem o maior spread do mundo, você tem só 40% do crédito em relação ao PIB, poucos pontos de atendimento. Tem um estudo do Ipea que fala que os juros reais que são cobrados aqui são de 60%. Na Europa, o mesmo banco cobra 5%. Não é esse sistema financeiro que nós queremos. Acho que não tem ninguém melhor que os dirigentes sindicais bancários para levar esse debate para a sociedade, de que esse sistema financeiro não nos interessa. E é o momento que temos hoje, de transformá-lo. E eu acredito muito nisso.

Compartilhe:

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp
Compartilhar no telegram
Telegram