Procuradoria da República investiga venda de ações do Banrisul

Um velho ditado ensina, com sabedoria, que as ações do presente costumam cobrar um preço no futuro e deixar marcas no passado. "Quem planta vento colhe tempestade", diz um dito popular gaúcho que se encaixa muito bem naquilo que o Governo do Estado em conluio com a diretoria do Banrisul fez na venda de ações do banco público dos gaúchos em 10 e 27 de abril. Depois de realizar duas vendas de ações na B3 marcadas pela ausência de comunicação por fato relevante) a casa daqueles que acharam que podiam fazer qualquer coisa com o patrimônio público dos gaúchos começa a cair.

Depois que o Ministério Público do Estado (MPE) anunciou a abertura de inquérito para apurar as vendas de papéis do Banrisul, na terça-feira (3), agora foi a vez de um investigador federal lançar seus olhos de águia e suas lupas na direção das duas transações e ao Palácio Piratini. O advogado Paulo Petri, do escritório Petri e Machado da Rosa Advocacia, recebeu na mesma terça-feira, 3/7, ofício assinado pela Chefe Substituta de Gabinete da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, Patrícia Coelho Py, datado de 25 de junho (veja reprodução mais abaixo). Nesse ofício, a servidora federal da Procuradoria anuncia que acolheu a representação do SindBancários e da Fetrafi-RS e encaminhou como "Notícia de Fato" à Procuradoria da República no Rio Grande do Sul.

A Notícia de Fato constitui um encaminhamento que dá ciência e pede providências à Procuradoria da República. Lembrando que, além do MPE-RS, a Comissão de Valores Imobiliários (CVM), já investiga o caso da venda de ações de 10/4 e 27/4. As operações estão sob suspeitas na medida em que ocorreu uma venda num valor muito baixo em relação ao pregão anterior e sem que houvesse aviso ao mercado por fato relevante. Além disso, a BTG Pactual, corretora contratada para realizar o leilão na B3, também ficou com um lote de ações na segunda venda.

Todo o procedimento de venda de cerca de R$ 50 milhões de ações ordinárias com direito a voto em 27 de abril ficou sob suspeita, o que levou as entidades sindicais a buscarem subsídios para demonstrar que há, no mínimo, a necessidade de investigar em profundidade a operação para ver se não houve beneficiários de uso de informação privilegiada e gestão temerária ao patrimônio público. Uma das maiores suspeitas recai sobre o anúncio de venda de ações e desistência logo em seguida, como ocorreu em 6 de abril para a venda de 10/4 (veja abaixo cronologia).

Para o presidente do SindBancários, Everton Gimenis, as duas operações de venda de ações do Banrisul em um intervalo de 17 dias estão sob suspeita e trouxeram prejuízo ao erário púbico. "O governo do Estado anuncia a desistência da venda de ações numa sexta-feira e vende na terça-feira seguinte um lote de ações de quase R$ 500 milhões. Ora, se o vendedor anuncia um produto em uma loja por um preço, mas desiste, ele está fazendo pessoas desistirem de comprar. Então, sem avisar vende aquele mesmo produto que anunciou para muito menos compradores do que poderia ter. Sem concorrência, o preço do produto cai. Assim é com as ações. Quem ganhou? Aqueles que ficaram sabendo. E quem são eles? São os mais próximos, quem estava dentro de um esquema para lucrar ali adiante numa pós-venda", ilustrou Gimenis.

Essa narrativa do presidente do SindBancários descreve muito bem o que aconteceu em 27 de abril. Depois de repetir que não venderia as ações, o governo do Estado vendeu num pregão de 15 minutos. E quem ganhou com ações que estavam 31% mais baratas em média do que no dia anterior foram aqueles que ficaram sabendo que os papéis estariam desvalorizados, como foi o caso da BTG Pactual, a corretora contratada para intermediar o negócio. Para levantar questões sobre essas transações, o SindBancários argumenta que pode haver a conduta de Inside Trading (Direcionamento com uso de informação privilegiada) nos relatórios que apresentou para órgãos de investigação estaduais e federais (veja na cronologia das denúncias do Sindicato e da Fetrafi-RS).

"Está ficando cada vez mais claro aquilo que tentam esconder: que o governo do Estado atropelou alguns procedimentos legais nesta venda de ações. Se não, a CVM não abriria procedimento para investigar. Nem o MPE. E agora tem um órgão de investigação federal, a Procuradoria da República, que recebeu uma informação para verificar se o processo de venda não beneficiou amigos do rei. Chegamos a considerar que, em ano de eleição, um governador que não tem trabalho para mostrar ficou desesperado. E a venda de ações do Banrisul ajuda a captar um recurso para fazer alguma obra pra tentar não fazer muito feio na eleição. Quer dizer, isso é o lógico. Creio que é preciso investigar tudo. Para onde foi o dinheiro?", acrescentou Gimenis.

Cronologia das denúncias do Sindicato e da Fetrafi-RS
29 de março: SindBancários e Fetrafi-RS ingressam com protesto judicial que é acolhido no mesmo dia na 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Alegre.

2 de maio: SindBancários e Fetrafi-RS protocolam junto ao Ministério Público de Contas documento de 17 páginas com investigação que aponta para a existência de irregularidades nas vendas dos papéis do Banrisul em 10 e 27 de abril.

4 de maio: SindBancários protocola na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) investigação de 17 páginas levantando suspeitas sobre venda de ações do Banrisul em 10 e 27 de abril.

8 de maio: SindBancários e Fetrafi-RS entregam ao Ministério Público do Estado (MPE) investigação com denúncia sobre venda de ações do Banrisul.

10 de maio: A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) oficializa a abertura de procedimento investigatório para apurar irregularidades na venda de ações do Banrisul de 10 e 27 de abril.

14 de maio: SindBancários protocola, na sede da Comissão de Valores Imobiliários (CVM) documento com investigação que aponta para uso de informações privilegiadas na venda de ações de 27 de abril.

24 de maio: CVM acolhe a segunda denúncia de suspeita de uso de informação privilegiada na venda de ações do Banrisul em 27 de abril.

5 de junho: SindBancários e Fetrafi-RS protocolam um Protocolo de Representação junto à Procuradoria Regional da República (PRR da 4ª Região) com denúncia de possível prática de Inside Trading (Direcionamento com uso de informação privilegiada) na venda de ações do pregão de 27 de abril.

25 de junho: A Procuradoria Geral da República da 4ª Região informa que determinou a autuação do expediente como notícia de fato para ciência e providências acerca da prática de manipulação de mercado e uso indevido de informação privilegiada na venda de ações do Banrisul.

Quem comprou?
Afinal, a BTG Pactual foi contratado para ser um intermediário ou podia ficar com ações? E quem é Plural? Não se tem notícias se a contratação do BTG foi feita por consulta pública. Deveria ter sido feita? Por via das dúvidas, a representação que o SindBancários e a Fetrafi-RS entregaram ao Ministério Público de Contas (MPC) e ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS) faz esses questionamentos. No pregão de 27/4, aquele de maior suspeita de ter havido uso de informação privilegiada, confira os percentuais de quem ficou com os papéis vendidos na B3: BTG Pactual (5,79%); Plural (65,35%); Planner (5,07%) e XP (4,11%).

Péssimo negócio
Segundo a Bolsa, entre 9 e 26 de abril, a ação ordinária (com direito a voto) teve preço médio entre entre R$ 25,30 e R$ 26,71. No dia 27, o valor do papel despencou ao preço mínimo de R$ 17,65, queda de 31% frente ao dia anterior. E o governo mandou o BTG Pactual vender com rendimento de R$ 52,2 milhões. O que aconteceu? Por que vender na baixa? Em 10 de abril, o governo vendeu 26 milhões de ações preferenciais (R$ 484,9 milhões). Somadas, as duas vendas renderam R$ 537,4 milhões. Mal cobre nem um terço da folha de pagamento dos servidores públicos do Estado. É um péssimo negócio quando o governo Sartori vende a galinha dos ovos de ouro e fica sem os ovos. De ouro!

Cronologia da venda de ações de 10 de abril
6/4/2018: Governo do Estado anuncia por fato relevante a desistência da venda de ações.

9/4/2018: Governo do Estado anuncia leilão para o dia seguinte. Não há fato relevante. A instrução normativa 358 da CVM é desrespeitada.

10/4/2018: Governo do Estado,, sem novo fato relevante, o´pera leilão de R$ 26 milhões de ações preferenciais por R$ 484,9 milhões.

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